A LINGUIÇA
Por Carlos Sena
“Encher linguiça” – pense numa expressão que gosto para significar “passar o tempo” enquanto se espera, por exemplo, a hora do avião. Encher linguiça num aeroporto é até menos mal, porque no geral, a “linguiça” fica pessimamente enchida quando a gente olha pros quatro cantos e não acha o que fazer. Num aeroporto, “meno male”, porque aqui a gente tem muita coisa pra ver e pra fazer enquanto a hora não chega. Claro que dependendo da hora que o avião vai chegar, a gente enche linguiça sem perceber. Neste momento, estou esperando o avião que vai para Recife – uma tal de companhia aérea chamada AZUL. O grande detalhe é que eu sairei daqui às 18h e vou para Campinas. Lá trocarei de aeronave e, no conjunto das horas, só chegarei à capital Pernambucana 12h30, portanto, nas primeiras horas do dia seguinte... E agora? Onde vou achar linguiça pra encher?
Se fosse no aeroporto Juscelino Kubistchek, a linguiça seria enchida com mais satisfação: lá tem lanchonete, ar condicionado, livraria, caixas de banco, lojas caras para o olho namorar, gente feia, gente bonita e ainda a sacada externa que a gente pode ficar com cara de besta vendo avião subir e avião descer. Neste terminal – o dois – onde me encontro agora, minha linguiça vai demorar pra encher. Aqui mais parece uma rodoviária de quinta. Pior: nem toda rodoviária é assim tão feia, com gente tão feia, com um calor do cão como está agora. As pessoas chegam com aquelas bagagens tipo saco de farinha de trigo, não bastassem ser a grande maioria fraca de feição. Por isso minha linguiça não será cheia facilmente, mas esticada. Esticar minha linguiça? Tô fora, afinal, linguiça não tem vocação de elástico e a minha linguiça muito pior. Portanto, pensei em mudar de metáfora: “azeitar o eixo do sol”? Mas, lá fora nem sol tem, só ameaça de chuva. “Encangar grilo”! Pronto. Adoro a expressão encangar grilo, pois eu fazia muito isso no interior quando eu era feliz e sabia. Só que aqui no DF não tem grilo, mas grileiro que só o cão e então como vou encangar essa raça triste? Pelo sim pelo não, melhor ficar “unindo nada a coisa nenhuma nesse computador” para ver se o tempo passa e a gente fica “azul” até Viracopos. Isso mesmo: Viracopos – é o nome do aeroporto que irei fazer baldeação. Prefiro baldeação a “trocar de aeronave” como as aeromoças falam.
Portanto, entre uma vigiada e outra no relógio, vejo uma moça feia que passa, um rapaz bonito que se esqueceu de passar, uma velha serelepe que abana a saia dando impressão que deu um pum, uma criança abusada com aquele choro de taquara rachada, e assim por diante. No final do salão uma lanchonete fuleira com as cadeiras todas ocupada e com as pessoas aboletadas fazendo, certamente, o que eu faço agora: “unindo nada a coisa nenhuma”. Será que elas preferem “encher linguiça”? “Ou azeitar o eixo do sol”? Se aqui tivesse plástico com bolhas, seria uma boa ficar estralando eles até dar a hora de embarcar. Ainda bem que não estou “azul” de fome, pois sabendo que isso pode ocorrer eu me previno – pareço mais menino amarelo que antes de sair de casa a mãe manda fazer xixi e faz logo um lanche para ele não ficar pentelhando...
No alto falante o moço chama para o embarque. Nessa lenga lenga eu nem enchi minha linguiça, nem azeitei o eixo do sol, nem encanguei meus grilos, tampouco uni nada a coisa nenhuma. Mas fiz essa crônica que é, sob certo ângulo de visão, uma boa linguiça cheia.
Por Carlos Sena
“Encher linguiça” – pense numa expressão que gosto para significar “passar o tempo” enquanto se espera, por exemplo, a hora do avião. Encher linguiça num aeroporto é até menos mal, porque no geral, a “linguiça” fica pessimamente enchida quando a gente olha pros quatro cantos e não acha o que fazer. Num aeroporto, “meno male”, porque aqui a gente tem muita coisa pra ver e pra fazer enquanto a hora não chega. Claro que dependendo da hora que o avião vai chegar, a gente enche linguiça sem perceber. Neste momento, estou esperando o avião que vai para Recife – uma tal de companhia aérea chamada AZUL. O grande detalhe é que eu sairei daqui às 18h e vou para Campinas. Lá trocarei de aeronave e, no conjunto das horas, só chegarei à capital Pernambucana 12h30, portanto, nas primeiras horas do dia seguinte... E agora? Onde vou achar linguiça pra encher?
Se fosse no aeroporto Juscelino Kubistchek, a linguiça seria enchida com mais satisfação: lá tem lanchonete, ar condicionado, livraria, caixas de banco, lojas caras para o olho namorar, gente feia, gente bonita e ainda a sacada externa que a gente pode ficar com cara de besta vendo avião subir e avião descer. Neste terminal – o dois – onde me encontro agora, minha linguiça vai demorar pra encher. Aqui mais parece uma rodoviária de quinta. Pior: nem toda rodoviária é assim tão feia, com gente tão feia, com um calor do cão como está agora. As pessoas chegam com aquelas bagagens tipo saco de farinha de trigo, não bastassem ser a grande maioria fraca de feição. Por isso minha linguiça não será cheia facilmente, mas esticada. Esticar minha linguiça? Tô fora, afinal, linguiça não tem vocação de elástico e a minha linguiça muito pior. Portanto, pensei em mudar de metáfora: “azeitar o eixo do sol”? Mas, lá fora nem sol tem, só ameaça de chuva. “Encangar grilo”! Pronto. Adoro a expressão encangar grilo, pois eu fazia muito isso no interior quando eu era feliz e sabia. Só que aqui no DF não tem grilo, mas grileiro que só o cão e então como vou encangar essa raça triste? Pelo sim pelo não, melhor ficar “unindo nada a coisa nenhuma nesse computador” para ver se o tempo passa e a gente fica “azul” até Viracopos. Isso mesmo: Viracopos – é o nome do aeroporto que irei fazer baldeação. Prefiro baldeação a “trocar de aeronave” como as aeromoças falam.
Portanto, entre uma vigiada e outra no relógio, vejo uma moça feia que passa, um rapaz bonito que se esqueceu de passar, uma velha serelepe que abana a saia dando impressão que deu um pum, uma criança abusada com aquele choro de taquara rachada, e assim por diante. No final do salão uma lanchonete fuleira com as cadeiras todas ocupada e com as pessoas aboletadas fazendo, certamente, o que eu faço agora: “unindo nada a coisa nenhuma”. Será que elas preferem “encher linguiça”? “Ou azeitar o eixo do sol”? Se aqui tivesse plástico com bolhas, seria uma boa ficar estralando eles até dar a hora de embarcar. Ainda bem que não estou “azul” de fome, pois sabendo que isso pode ocorrer eu me previno – pareço mais menino amarelo que antes de sair de casa a mãe manda fazer xixi e faz logo um lanche para ele não ficar pentelhando...
No alto falante o moço chama para o embarque. Nessa lenga lenga eu nem enchi minha linguiça, nem azeitei o eixo do sol, nem encanguei meus grilos, tampouco uni nada a coisa nenhuma. Mas fiz essa crônica que é, sob certo ângulo de visão, uma boa linguiça cheia.