Ela

Apareceu de repente. Confesso que levei um grande susto. Seus olhos e rosto assustados percorriam-me de baixo para cima e vice-versa. Parecia já me conhecer, não teve medo de mim, talvez por isso tenha me assustado tanto. Mas, passado o primeiro momento, fui movido – mesmo sem sair do lugar onde estava – por um sentimento de ingênua curiosidade. Pensava: de onde será que veio? Por que me olhava daquele jeito inquisidor? Não conseguia imaginar como tal criatura poderia agir daquela forma.

Eu podia sentir e ver até as batidas apressadas e inquietas de seu coração. De pé, em frente a este que vos escreve, resolveu passear, deslizar, flutuar... Parecia que me flertava com seu jeito misterioso, calmo e discreto. Tirava minha concentração. Andava, se mexia de um lado para o outro sem fazer a menor cerimônia. E eu? Continuava fazendo o que estava no momento em que apareceu sem pedir licença nem perdão algum por me deixar daquele jeito: inquieto.

Parecia despreocupada – a meu ver, é claro. Sentado continuava absorto entre as letras, palavras, e frases que lia. Porém, sem a mesma atenção e compreensão de antes. Agora corria como se quisesse me dizer algo: uma mensagem poderia ser. Não sabia se eu a tinha encontrado ou ao contrário. Ficamos ali. Eu parado e ela flertando com meus pensamentos e minha cara de bobo. Sem medo continuava seu passeio.

Vai parecer clichê, mas vou dizer assim mesmo: Como em um passe de mágica, desapareceu sem deixar vestígios. Pensando melhor talvez tenha deixado pegadas, pequenas e suaves no chão. Chão ainda molhado da chuva que caíra naquela manhã. Devo confessar aqui, que fiquei impressionado com tamanha destreza, coragem ou até loucura da criatura, sei lá. Tentando não dar mais atenção àquilo que fazia, nem pensar em suas peripécias, voltei a ler o calhamaço de mais de 600 páginas que rolava em minhas mãos. Dessa vez mais concentrado. Pelo menos era o que pensava.

Minutos depois, e cinco, seis, ou sete páginas subsequentes, o som inquietante e rápido de seus passos invadiram meus ouvidos, e um sentimento estranho me tomou inesperadamente. De novo, estava ali, de pé. Parecia que brincava. Com um ar igualmente misterioso e tranquilo da primeira vez em que me aparecera. Mas sem que pudesse me aproximar, desapareceu. E eu continuei lá, perdido em meio às centenas de páginas e pensamentos, ainda sem entender muito bem o que acontecera naquela tarde.

Leomir Santana
Enviado por Leomir Santana em 26/04/2013
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