Papo de Barbearia

PAPO DE BARBEARIA

( República de Itapoã – V.Velha-ES. )

É o que afirmo sempre : muitas coisas boas já têm aqui em Itapoã , meu dileto amigo Chico. Temos uma boa estrutura comercial de serviços – supermercados, padarias, farmácias, igrejas -, também temos um comércio bastante variado tais como: salões de beleza, academias de ginásticas, supermercados, farmácias, Bares, colégios, restaurantes, lavanderias, etc.. Entretanto, falta-nos um atendimento médico de emergência/urgência – um Posto de Saúde Público – 24h., com plantões nas seguintes especialidades médicas: Clínica Médica ( Geriátrica e Pediátrica); Ortopédica ; Cardiológica; também atendimento em enfermagem.

Veja só, por ocasião das campanhas de vacinação, ficamos ( a comunidade) todos meios perdidos, desorientados ( idosos então! Por falar nisso, para velhos só Asilos,nenhuma outra mordomia. Idoso tem tudo!); grandes são os desencontros; “ Tem idoso tomando vacina contra poliomielite e criança tomando vacina contra gripe da terceira idade”...

No nosso Bairro a população de idosos, (fora velhos) aposentados é significativa. Casos de emergências médicas ocorrem a toda hora. Então, corre-se para os Postos de Saúde de Coqueiral de Itaparica ou da Glória. Quem pode e/ou tem plano de saúde são atendidos nos Hospitais: Vila Velha ou Santa Mônica.

Se você sair por aí e observar o que tem de idoso (velho?) assanh... “Iiiiii, olhe só quem vem lá na esquina! É o Cri, e parece meio apressado”.

“É mesmo Nandú. Ei! Cri, chega mais, por que essa pressa toda? Uau cara! Suas mãos estão sujas de tinta”.

“Nem me fale, nem me fale! Ei Nandú! Tudo bem? Estou puto da vida. Só mesmo você Nandú, que ainda acredita neste país. Ninguém respeita ninguém... Uma zorra!”

Este é o Cri que eu conheço: reclama de tudo E Ele vai fundo, embalado...

“Atentem só para o desrespeito à cidadania: eu estava andando pela calçada , passando em frente de um edifício em construção ( aliás, como se constroem em Itapoã! ), absorto e distraído, e distraidamente batendo levemente com as costas da minha mão no muro, quando de repente: Plash!... Borrei minha mão na tinta óleo fresca; eles haviam acabado de pintá-lo – pintura de fundo e letreiro; ainda por cima, vejam só a minha camisa, respingos de água suja e tinta que caia dos andares superiores da obra sobre a calçada. Olhei para cima, nenhuma proteção, nada, nem para-ciscos! Onde a segurança? Isto é demais.”

Ouvia aquilo resignado. Era o principal discurso do Cri ( Cri sem o s, no singular, ele não era plural, ele frisa bem isto e sempre!), a reclamar de tudo e que é errado só acontece com ele. Ele é um azarado...

Hoje, particularmente apresentava estar mais ainda mais irado e isto pontuava com maior nitidez, sua feiúra, suas feições caprinas, ainda mais com aquele indefectível cavanhaque... Era demais para o meu gosto...

“Mas Cri, por que essa pressa? Para onde você vai? Você ainda não nos disse.” Perguntou o Chico.

“Pelo jeito vai tomar banho, limpar essa tinta, trocar de roupa”.Comentei.

O Chico contestou: “Não, não antes vou ao barbeiro acertar o cavanhaque e baixar um pouco esta cabeleira, ali no Salão Shalom, mesmo assim meio sujo”.

Pensei cá comigo: É, é assustador: sujo, irritado, feio com feições caprinas cheia de pêlos desgrenhados... Mas é barbeiro um tosquiador ou cabeleireiro? Aproveitando o idéia de gozação, emendei:

“Cri, neste salão, o Shalom, segundo me disseram, os dois barbeiros são racistas.”. “Como assim racista! Protesta o Cri”.

“Ouvi dizer, isso a boca miúda, que as tesouras deles só cortam os fios de cabelos pretos, os fios brancos ficam; você acaba ficando cheio de cabelos brancos, tal qual Papai Noel!”

“Ora Nandú, sacanagem cara, vá gozar o bode!”

... (Ops! Feições caprinas?... você “apara” hein!).

O Chico, meu dileto amigo, aqui sentadinho, com uma cara enfadonha, esperando o Cri, lendo estas revistas velhas ( Caras, Veja, arre!), tolerando e se sujando com essa nuvem de cabelos no ar, arrastada pelo ventilador do Salão, vendo a sofrível transformação a que passa o nosso amigo – cada vez mais com cabelos brancos - e, para matar o tempo, já que eu estava enjoado de esperar e a ouvir os papos abobrinhas, próprios de barbearia – tipo: futebol, parada gay etc...-ocorreu-me então poetar...

Não se apoquente e agüenta aí!

Unissex? Cabeleireiros ou Barbeiros? Salão Shalom... Mais um?

Outro? Na Jair de Andrade?... Tem piedade!

O dono Edu, careca, cobra uma merreca,

para cortes a máquina. Zero? Não quero!

Para o cabelo ficar curto... em pé?... Num Salão Unissex?

...Em pé? Para baixar... Vejamos... Só Gumex.

À porta de braços cruzados, torce para chover.

A chuva não cai... Muito menos freguês, eu só quero ver.

Ô! Edu, não chia você é da Bahia,

tem o Roque como parceiro ou como obreiro? Não zombe, não ria!

Roque assumiu o lugar do antigo barbeiro*, um seresteiro,

não era parceiro, dizia-se cantor... que horror. Sim um tenor!

Cantor... tenor uma ova.

Roque esqueça, inove, renova!

O outro tinha um jeito esquisito, maneiro...

Não era barbeiro e sim um doce cabeleireiro, faceiro.

De trejeito gozador!

Edu descruza os braços, abra os verdes olhos, saia da calçada, saia da via.

Ponha as mãos nos bolsos, mas cuidado: golpeado serás, tesoura não é escorpião.

Na Bahia, nas esquinas, braços cruzados chuvas chamam; verdade, não ria.

Roque descruza os braços. Ler em hebraico o livro de Daniel? Só profecias?

É sério. Profético! Coisa antiga não falha.

Corta cabelos longos, lisos, duros – máquina, tesoura. Raspo?

Corro riscos: tendinite? Quebro o pulso, canso o braço!

É sério trabalho muito, verdade, não ria.

Para liso ficar, escanhoar, use sabão

Não, não se usa mais para barbear e escanhoar, uma antiga navalha...

O Chico com as roupas cheias de pelos “voadores” e já de saco cheio também, vira-se para sonhador Nandú e diz: “ Vamos andando, o Cri terminou. Depois dessa palavrinha aí “escanhoar”você não se acha um poetastro?”

(*) Stefferson : Morto por companheiro de profissão em 2012

“ Henrique o que tu fizestes?

Tem valor?

Golpeado o barbeiro cantor

partiu.

E você?

Aqui só saudades

provocastes...

Muitas lembranças do barbeiro tenor...”

BNandú 05/05/2010 - Revisão: 23/04/2013

BNandú
Enviado por BNandú em 24/04/2013
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