Marinheiro só.

Para o sistema educacional meu aluno é somente um número; um número que compõe dados indicadores. Eu também acabo por culminar somente em um algarismo que compõe dados que vão para um papel, para a memória de um computador qualquer.

A educação é um ato político e isso garante acesso e permanência a todos, entretanto só a política não supre toda a relação humana que uma sala de aula abarca.

O professor está só no seu trabalho, sozinho com seus muitos alunos.

Faltam salas adequadas, faltam recursos, faltam bons projetos que verdadeiramente estejam atrelados às necessidades das escolas, principalmente às da periferia; entretanto, em compensação, lotam nossas salas. Faltam tantas coisas, mas alunos têm de sobra. O professor está só em seu trabalho com seus muitos alunos.

Temos metas a serem cumpridas, temos que corresponder aos “bons” números, temos que fazer parte do todo e incluir nossos alunos nos objetivos que as secretarias de educação e as políticas educacionais estabelecem sem nos consultar. O professor está só em seu trabalho e sua opinião não representa importância.

O lado sensível na Educação é dispensável para o topo da pirâmide, mas para a base docente é totalmente importante, pois o aluno está ali com suas vivências e exige atenção de nossa parte. A pirâmide toda deveria estar sensível ao corpo discente, mas o topo está sensível somente aos aspectos numéricos e financeiros da educação. O professor está só em seu trabalho e faltam políticos que gostem do ato de educar.

Já tive alunos que não atingiram metas, não corresponderam aos números exigidos, mas poxa vida (!), como evoluíram dentro de suas possibilidades, como cresceram cognitiva e socialmente nas brincadeiras e conversas estabelecidas em sala de aula e não somente no aprendizado do alfabeto, contudo como estou sozinha em meu trabalho somente eu que vi isso.

Já me desestruturei também durante a aula, pois me vi limitada, apesar de vários estudos, diante de problemas psicológicos e familiares que as crianças carregam consigo em suas mochilas. O peso desses problemas muitas vezes é maior que o dos cadernos e livros e as pequenas colunas se curvam não aguentando tanto peso. O professor está só em seu trabalho e os problemas da vida que as crianças encaram são superiores aos problemas matemáticos que tentamos ajudar a resolver.

Sou (ou estou?!) professora, me sinto só em meu trabalho, às vezes chego a pensar que estou em uma profissão impossível. Valorização profissional supera somente maiores salários, exige, por sua vez, melhores condições de trabalho e a oportunidade de sermos ouvidos na formulação de políticas e metas. Educação é um ato coletivo e não um ato solitário, pois todos se educam mutuamente em sociedade, a escola apenas sistematiza. Essa sistematização deve também ser coletiva.

Estamos todos no mesmo barco, apesar da solidão profissional; somos marinheiros solitários em meio à multidão. Que possamos abrir nossos olhos, que possamos nos enxergar e nos auxiliar. Todos educam e todos se educam. Educação é plural.

(14/03/2013)

Juliana Lima de Souza
Enviado por Juliana Lima de Souza em 22/04/2013
Reeditado em 22/04/2013
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