Salão do Lilas

Era um Sábado frio de garoa típica de São Paulo. Eu, Quirino, Martinelli e o Jurandir, todos bons de gole. Teimávamos em querer ficar de fogo a qualquer jeito para “zuar” nas gafieiras. Já havíamos bebido de tudo; pinga, rabo de galo, Gin, cerveja e outras bebidas, mas não chegávamos a ficar no “ponto”.

Mesmo assim, decidimos entrar no primeiro salão da nossa rota. Lá fomos nós. O salão ficava na Rua São Caetano e “zanzamos” um pouco por lá, olhamos o ambiente sem achar nenhuma graça, e em seguida caímos fora. Precisávamos tomar mais algumas pra ter graça. O Martinelli teve a idéia de comprar uma garrafa de “Fogo Paulista” para completar. Fogo Paulista, como o próprio nome diz é tomar e virar um foguete. A bebida às vezes tem dessas coisas, quando forçamos a não ficar de “fogo”, com duas ou três doses já ficamos tontos, mas quando queremos, não há cristo que o faça.

Tomamos o Fogo Paulista que, misturado à outras bebidas deixava qualquer um “afoguetado”. No entanto, lá estávamos nós ainda bem lúcidos.

O Jura sugeriu que déssemos uma chegada no salão do Lilás. Esse salão era uma espécie de gafieira de luxo; localizava-se bem no centro de São Paulo. Um sobradão antigo, bem na esquina da Sé e Rangel Pestana; era freqüentado por gente selecionada da média roda considerada de alto gabarito.

Tocamos pra lá. Subimos uma escadaria de madeira bem alta, até chegar no salão. Procuramos uma mesa em lugar bem estratégico, próximo à pista de dança. Pedimos umas “cervas” para completar. Enquanto tomávamos a bebida corríamos os olhos pelo salão. Do nosso lado havia uma mesa com dois casais, conversando alegremente.

Nesse meio tempo, o “Fogo Paulista” já havia iniciado o seu efeito. Com o calor da bebida esquentamos o corpo e a cabeça. O Jurandir sugeriu que fôssemos tirar umas gatas para dançar. Lã fomos nós.

.Mas o Quirino cismou de tirar a mulher da mesa vizinha; o azar é que ela estava acompanhada. Tentou puxar a mulher para dançar e ela educadamente, se recusou.

Deixamos o amigo ali resolvendo o problema com a mulher, eu e Martinelli tiramos duas gatas para dançar. Enquanto dançávamos ouvimos o Quirino argumentar bem alto: ”nos estatutos das gafieiras diz que nenhuma dama pode recusar o convite do cavalheiro”. Não sei por quê o Quirino cismou de tirar justamente aquela mulher que já estava acompanhada. Quirino era um sujeito forte, musculoso e de corpo atlético; era um “boa pinta”.

Diante da recusa da mulher, Quirino já estava perdendo a cabeça argumentando que jamais ela poderia recusar o convite de um cavalheiro, de acordo com os estatutos dos salões de gafieira. Só que ele esqueceu um artigo muito peculiar do mesmo estatuto, que dizia: “Salvo quando a mulher estiver acompanhada de um Cavalheiro”.

Esse foi o azar dele. O Cara companheiro de mesa da dama foi obrigado a reagir. Quando vimos o bafafá entre o Quirino e o homem da mesa, paramos de dançar e fomos em sua direção, com a disposição de lhe dar ajuda. Jurandir continuava tomando sua cerveja sem incomodar com o que estava acontecendo ao lado.

Ao chegarmos ao local da discussão levantaram da mesa dois homenzarrões tipo “Huk”, desencadeando a maior confusão. De cara o Quirino tomou um pescoção que nem sei onde foi parar. O Martinelli também levou uns cascudos. A algazarra foi total. Eu e o Jurandir saímos de mansinho misturando no meio dos pares do salão para cair fora dali. Tomei o rumo da saída, mas antes de atingir os primeiros degraus da escadaria senti que algo me atingiu a nuca me derrubando escada abaixo. Foi nesse momento que vi o Martinelli e o Quirino que já estavam lá embaixo na calçada cheios de hematomas pelo rosto, sinal de que já haviam rolado antes de mim. Como isso aconteceu eu não sei. Eu tinha os cotovelos, braços e pernas esfolados. Olhamos um pra cara do outro e perguntamos pelo Jurandir, mas nenhum de nós teve a coragem de subir ao salão para ver onde ele estava, ou o que havia acontecido.

Nesse momento, um corpo desceu rolando pela escadaria até chegar perto de nós. Era o Jura. Ele se levantou rapidamente com uma esperteza singular com as mãos nas pernas fazendo caretas.

_ E agora pessoal... Ninguém respondeu nada.

Em passos rápidos caminhamos rumo a qualquer lugar, desde que fosse bem distante dali. Jura vinha mais atrás capengando e gritou: “Hei, vocês estão andando muito depressa”. Olhamos para trás e quando vimos o seu estado, diminuímos os passos para dar tempo a ele para nos alcançar. Quando ele se aproximou, falou: ”Também vocês vão mexer justo com a mulher de um Capitão...

As duas mesas estavam ocupadas por dois oficiais do Exército”....

Demos outra olhada pra trás e vimos na soleira da porta de entrada do salão, os nossos bons vizinhos olhando para o nosso lado.

Querem voltar???? Perguntei, mas aumentando a velocidade.

HEIN?????

Luiz Pádua
Enviado por Luiz Pádua em 21/04/2013
Código do texto: T4252297
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