O PORNOGRÁFICO MENINO HOLANDÊS

A troça, ou chamada comumente de trote, é geralmente uma situação armada para produzir o que seu agressor arquiteta, e imagina que seja um resultado físico ou emocional humorístico, às custas da sua vítima. Hoje em dia isto é crime chamado de bulling.

Mas vamos a história.

A vítima foi um inocente menino holandês.

Moleque no meu tempo de guri, para ser dos bons, tinha que ser arteiro. Aprender e falar besteiras; Pegar ovos dos ninhos das galinhas; Pegar, às escondidas, frutas no pomar de um velho ranzinza; Tocar, e sair correndo, as campainhas das portas das casas; Mostrar, mesmo imberbe, orgulhoso o número de pentelhos que brotavam cobrindo o saco; Andar descalço, sem camisa, de calção rústico e rasgado; Mapear todos os ninhos dos passarinhos; Jogar futebol na rua com bola construída de meia; Andar armado de estilingue no pescoço e bolsos cheios de pelotas; Subir em árvores; Fazer e empinar papagaio; Rodar pião; Jogar bolinha de gude; e quando tinha uma guria no grupo brincar com ela de paciente e médico, e se apaixonar doidamente por uma menina ranheta qualquer.

Estávamos, no finalzinho da tarde, brincando de betes quando lá na esquina, meio arredio, medroso, um tanto acabrunhado, se aproximou um moleque de cabelos muito mais loiros que os loiros cabelos do mais loiro da turma. Olhamos desconfiados imaginando que fosse espião de algum outro bando. Corremos até ele, fazendo um círculo a sua volta, indagando:

- O que você quer?

Com os olhos assustados e lábios trêmulos, numa dicção arrastada, quase incompreensível e um tanto obscuro, tivemos dele, como resposta:

- Mim holandês.

O entendimento é um processo que se relaciona com a totalidade dos elementos que fazem parte da estrutura do relacionamento. Se você é desprovido da voz ou do ouvido, faz-se entender pelos gestos.

Em pouco tempo o menino holandês estava perfeitamente adaptado e enturmado na nossa gangue.

Algumas dificuldades de comunicação começaram a surgir, e decidimos que ele deveria aprender a nossa língua. Resolvemos que ele iria aprender tudo, mas seria do nosso jeito moleque travesso.

E as aulas começaram quase que imediatamente.

O pequeno holandês estava cada vez mais feliz, e nós nos divertindo muito com isto.

A mão era pé; A cabeça era bunda; A língua era o pinto; Pão era bosta e assim na maior sacanagem avançávamos no projeto de alfabetização pornográfica para aquele pequeno e inocente gringo. De todas as partes do corpo, eliminamos o cu, pois para o holandês cu era vaca, e com isto não teria muita graça para nós.

Paramos completamente, por dias seguidos, de praticar qualquer tipo de jogo ou brincadeira para se dedicar única e exclusivamente à missão hilária de ensinar a língua portuguesa equivocada ao nosso novo integrante.

O aluno progredia muito bem ao som de nossas gargalhadas.

A rua, palco de nossas brincadeiras, era um verdadeiro big brother. Das janelas semi abertas, olhos curiosos, maliciosos e contestadores vazavam espiando a nossa safadeza.

Um dia a coisa deu em merda.

O pai do menino levou-o a uma festa religiosa, e todo feliz pediu para que ele exibisse tudo o que tinha aprendido na escola do beco.

- Mostra, meu filho o que você aprendeu com seus amigos! Falando em holandês suplicou ansioso o pai.

E ele, lamentavelmente começou a falar.

As moças, meninas e mulheres horrorizadas, escandalizadas, em debandada correria, como aves assustadas, escafederam-se da sala, e os homens, às gargalhadas, escutavam o pequeno holandês que pedia bosta para comer e no lugar de pedir água para beber, pediu para uma senhora de idade fazer sexo com ele.

Os anjos fugiram, mas Deus ria às escondidas.

As mulheres se evaporaram da sala, e os homens se divertiam instigando mais e mais o pequeno pornográfico.

O pai, todo orgulhoso, querendo entender e participar daquilo tudo, pergunta a um poliglota o que estava acontecendo.

O poliglota todo temeroso, medroso, meio constrangido, levou-o até um canto, e ao pé da orelha explicou, tin tin por tin tin, tudo o que estava acontecendo .

A reação foi imediata. Pegando pelas mãos o escabreado pai do menino levou-o incontinente para casa.

Dias mais tarde, abandonando a nobre missão de professores pornográficos, voltamos as nossas inocentes brincadeiras de rodar pião, jogar futebol com bola feito de meia, brincar de esconde esconde.

Nunca mais vimos o menino, mas a lista de reclamações das malditas mulheres, que espiavam curiosas, se masturbando, pelas gretas das janelas, deixou em cada um de nós as marcas das varas de marmelo na bunda como paga pelas aulas ministradas.

Mario dos Santos Lima
Enviado por Mario dos Santos Lima em 20/04/2013
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