SAUDADES DE BRIGITTE MONTFORT
Minha paixão pela escrita vem, muito provavelmente, do hábito de leitura que tenho desde que fui alfabetizada. Na infância eu adorava ler as histórias que compunham os livros da coleção Reino Infantil; já na adolescência, além das revistas O Cruzeiro e a Manchete, eu preferia me deliciar com as Seleções do Reader’s Digest e com os livrinhos de bolso da editora Monterrey.
Eu apreciava os de faroeste, escritos por Ryoki Inoue, mas adorava a série ZZ7, escrita por Lou Carrigan. Na época eu nada sabia sobre esses autores, mas descobri que o primeiro se chamava José Carlos Ryoki de Alpoim Inoue, nascido em 1946, em São Paulo, formado em medicina com especialização em cirurgião de tórax, e laureado pelo Guiness Book Records como o autor de mais de 1.079 romances, usando 39 pseudônimos por exigência dos editores. Já o segundo era um espanhol de Barcelona, nascido em 1934, com o nome de Antonio Vera Ramirez.
Minha personagem preferida era filha de Giselle Monfort, “a espiã nua que abalou Paris”, cujos 04 livros foram escritos pelo repórter David Nasser nos anos 40. Seu nome era Brigitte, tinha 28 anos, sedosos cabelos cor de ébano, olhos profundamente azuis, corpo escultural, pele dourada pelo sol dos cinco continentes, e o leitor via isso muito bem nas capas desenhadas por José Luiz Benício.
No dia a dia, ela era jornalista, trabalhava no Morning News, tinha como editor chefe o Miky Grogan e como colega querido e apaixonado por ela o Frank Minello. Extremamente culta, falava perfeitamente diversos idiomas e possuía raciocínio lógico fantástico.
Ocorre que ela, também era “Baby”, a mais bela e perigosa espiã da CIA, liderada pelo inspetor Charles Pitzer, a quem chamava carinhosamente de Tio Charlie. Aos colegas de trabalho, ela chamava apenas de “Johnnies”, uma forma de não ter como denunciá-los, caso fosse capturada por espiões da KGB ou do Deuxième Bureau, ou se lhe injetassem Pentotal, o soro da verdade.
Apesar de ser americana, tinha amigos em outros países como o alemão, Alexandria, o inglês, Mister Fantasma, e o francês, Monsier Nez, mas o amor de sua vida era Ângelo Tomasini (às vezes ele usava o nome de Clark Coleman), apelidado de “Número Um”, um gostosão que morava na ilha de Malta. Ele era tão bom quanto ela no judô (ela era 5º Dan), no caratê e na capoeira. Os dois eram capazes de pilotar qualquer avião, helicóptero ou barco; eram excelentes mergulhadores, hábeis paraquedistas e peritos no manuseio de quaisquer armas.
Brigite usava uma pistolinha de coronha de madrepérola, presa por tiras de esparadrapo cor de carne, à parte interna de sua coxa esquerda. Em sua inseparável maletinha vermelha adornada com minúsculas flores azuis, ela levava sob a aparência de produtos de toilette, poderosos venenos ou narcóticos, fios de arame para estrangulamento, explosivos, lâminas, rádios de bolso, emissoras de ondas para localização de inimigos etc.
Milionária, elegantíssima, gostava de se vestir com as peles caras de vison e chinchila, e de sorver seu champanhe predileto, “Don Perignon", safra de 1955, bem gelado e em uma taça de cristal, tendo ao fundo uma cereja. Quando chegava a seu apartamento em Manhattan, cansadíssima de suas aventuras, era recebida por Cícero, seu cãozinho chihuahua, e por Peggy, sua empregadinha loira.
Creio que não cheguei a ler os 500 livrinhos da série, mas a cada semana eu ia à banca de revistas em busca de novas aventuras criadas pela cabeça fantástica de Lou Carrigan, e lamento não ter mais nenhum deles para reler. Sei que era ficção, mas creio que parte do meu caráter foi formado pelos bons valores cultivados pela personagem
Confesso que me lembrei de Brigitte por ocasião das grandes tragédias americanas. Se de fato ela tivesse existido, duvido que Osama Bin Laden conseguisse destruir as torres gêmeas do World Trade Center, no dia 11 de setembro de 2011, ou que alcançassem os seus intentos os malucos que, volta e meia, resolvem explodir bombas caseiras, ou sair dando tiros a torto e a direito no USA.
Dessa forma, talvez, os americanos fossem menos traumatizados e não nos mandassem tirar os sapatos e ficarmos quase pelados ao passarmos no serviço de imigração para entrar na terra do Tio Sam. Aliás, pelo “andar da carruagem”, depois do episódio das bombas caseiras, feitas com panelas de pressão, e detonadas ao término da maratona de Boston, MA, acho que a palavra “quase” aí de cima vai sumir.