DITOS E DESDITOS

Prof. Antônio de Oliveira

antonioliveira2011@live.com

É comum o dito: “Eu era feliz e não sabia”. Mas em geral não se ouve porque em geral também não se diz: Eu era “infeliz” e não sabia. Fica parecendo que hoje está tudo pior do que antes. O certo é que às vezes um dito vale por um não dito quando se dá o dito por não dito. O que pode ser uma falta de dita, infelicidade, desventura, um dito desditoso. É gostoso cantar que a felicidade foi-se embora e a saudade no meu peito ainda mora. Mas é saudável também pensar que muita coisa boa tem acontecido.

Chico Buarque sabe das coisas e é capaz de dar um bom conselho, lá do outro lado da medalha. Quem corre atrás do tempo veio não se sabe de onde, pois devagar é que não se vai longe. Semeia o vento. Na sua cidade vai pra rua e bebe a tempestade.

Essa história de ditos e desditos me faz lembrar uma fala de Jesus: “Ouvistes o que foi dito: olho por olho, e dente por dente; amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam.” Nunca se ouvira dizer formalmente, e desdizendo toda uma tradição testamentária, essa espécie de loucura, para uns, e de escândalo para outros. Um dito radical por oposição a outro dito também radical: à lógica da vingança propõe-se a sublime transcendência do perdão. Em essência, um divisor de águas.

Por tradição cultural, essa lição a gente sabe de cor. Só nos resta aprender. Na prática, segundo Thomas Hobbes, é a luta de todos contra todos. Governos tornados monstros despóticos, mitos e mitológicos, leviatãs devoradores, desdizem hoje, em nome da governabilidade, o que disseram ontem, na oposição. É o dito pelo não dito institucionalizado. E, dessa forma, tudo o que se diz do governo é tomado como diz-que-diz, diz-que, diz-que-me-diz-que, disse-que-disse, disse-não-disse, boataria, falatório, mexerico, fofoca, intriga da oposição, sensacionalismo da imprensa. Então, fica o dito pelo não dito. Até a próxima contradita...