COM QUE ROUPA...
Prof. Antônio de Oliveira
antonioliveira2011@live.com
Segundo antigo modo de pensar, reafirmado pelo P. Manuel Bernardes em Os Últimos Fins do Homem, o que faz o religioso bom não são “os hábitos de pano, ou de burel, senão os das virtudes". No entanto, José Saramago observa, no seu livro A caverna, que “aparentemente é assim, mas, ao contrário daquilo que geralmente se cria e sem pensar se afirmava, o hábito faz realmente o monge, a pessoa também é feita pela roupa que leva, poderá não se notar logo, mas é só questão de dar tempo ao tempo”. A expressão “o hábito não faz o monge”, dada a força simbólica do visual, poderia vir a ser reformulada, como em Psicologia do Vestir de Umberto Eco, ficando assim a frase: O hábito fala pelo monge.
Com efeito, considerar os acidentes não é menos importante que considerar a substância. A roupa cria um condicionamento. Altera, inclusive, a visão de dentro para fora. “Autorizados filósofos e cristãos disseram que o vestido atua imperiosamente sobre o moral do indivíduo”, reconhece Camilo Castelo Branco. Não há ninguém totalmente livre: livre de obedecer a alguém, livre de um dever a cumprir, livre do relógio, do celular, do computador, do carro, da roupa como uma segunda pele. Na verdade, o que não faz um jaleco, um uniforme, uma beca, gravata, uma farda, um par de botas ou um salto alto, uma arma na cintura, um vestido sedutor, uma fantasia de carnaval, brincos, óculos escuros, uma pulseira, um anel, bigode, cabelos, se curtos ou longos, uma burca, um produto artesanal ou de grife! A imagem de Carmen Miranda é inseparável de seus balangandãs.
Todo traje tem seu peso, e seu custo. “Nada influencia mais profundamente o sentir do homem do que a fatiota que o cobre”, nas palavras de Fradique Mendes, de Eça de Queirós. “Toda a roupa recebe a alma de quem a usa”, assim dá seu veredicto Mia Couto, n’Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra.
É isso aí. Encarar o ser humano histórico, cultural, faz a diferença. E como faz!