O namoro de portão.

Eu costumava espera-lo às sete horas no portão, abria-o um pouco e ficava em pé olhando para a rua. Ele era meu vizinho, nossas casas eram separadas por uma esquina. Ele descia a rua andando com passos rápidos, ajeitava o cabelo com uma das mãos enquanto olhava para o chão. Eu abria o portão e saia, ele olhava para mim e sorria um sorriso tímido, um riso de adolescente.

Ele me abraçava e me beijava, um beijo leve, doce, tímido. Eu correspondia o beijo com receio, eu sentia receio de magoa-lo, ele era tão amável, tão gentil, tão do bem que eu o via como um cristal. Costumávamos sentar na calçada da minha casa, uma casinha simples de paredes amarelas e portões brancos. Ele contava histórias sobre sua família a qual já conhecia, eu contava histórias sobre a minha, na maioria das vezes engraçadas, minha família sempre foi dramática e exagerada.

Eu gostava do cabelo dele, do cheiro dele, suas roupas cheiravam a amaciante o que me transmitia conforto. Eu gostava tanto da ideia de ter um namorado para namorar no portão, de ter alguém. Quem não gostar de ter alguém? Saber que é de alguém? Mas eu era muito jovem e não sabia lidar com a felicidade, a felicidade guardada em uma caixa. Então eu tive que matar ele, porque eu era estranha e ele era mais do que eu. Eu não conseguia ficar ao lado de alguém que me fazia me sentir menos. Eu não sabia amar, não sabia ser feliz, aliás, nunca soube como ser feliz.

Então ele foi embora e voltou com ela, ela que era mais do que eu e igual a ele. Na primeira vez que os vi juntos me senti menos do que eu achava que era, doeu, senti raiva, chorei escondido, eu nunca seria mais do que eles dois. Eu era a vilã que não soube amar, era a ex que estragou tudo porque se achava um lixo, porque pensava que não merecia nada, nem amor, nem felicidade. Eu gostava do sofrimento, de viver sem vaga, do drama, das músicas tristes, das noites de chuva. Eu era a menina que namorava o cara errado na calçada e esperava você voltar da casa dela só para observá-lo virar a esquina e imaginar que ele saia de lá, da minha casa.

Eu fui aquela que a consolei quando você foi embora, que li todas as cartas trocadas pelos dois, enquanto me sentia menos, enquanto me sentia infeliz, enquanto me sentia culpada. Ajudei a recolher todas as fotos dos dois enquanto pensava que poderia ter sido eu. Ela chorava por você nos meus braços, enquanto eu chorei por você sozinha no quarto. Eu me consolei sozinha. Você soube quando ela começou a te amar e quando deixou de te amar, mas você nunca soube quando eu comecei a te amar e quando deixei de te amar. Agora eu amo os dois, mas ainda me sinto menos.

Sidy Batalha
Enviado por Sidy Batalha em 17/04/2013
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