Um encontro no elevador

Tempos atrás, morava em meu prédio um ator muito famoso. O edifício tem poucos moradores, de maneira que raramente compartilhamos viagens de elevador. Além desse fato, uma espécie de acordo misantrópico tácito faz com que a maioria de nós evite compartilhar o elevador já ocupado.

Uma tarde, no entanto, quando o elevador chegou em minha porta, mesmo tendo ouvido um pigarro, provavelmente de alerta, vindo de seu interior, abri a porta e entrei.

Para minha surpresa, lá estava o ator, galá de novela, em trajes bastante sumários. Usava apenas uma espécie de short, vendida como cueca. Cumprimentei o vizinho e tentei me comportar de maneira natural, no interior da caixa espelhada. Creio que ostentava um sorriso de divertimento em resposta ao olhar acusatório do vilão, que pretendia com isso inverter as posições e me transformar no desviante.

Chegando ao térreo, logo ao abrir a porta, nos deparamos com a esposa do homem, carregada de embrulhos; ela me olhou boquiaberta e estática, enquanto o ator a fuzilava com um olhar penetrante de vilão de TV.

Deixei-os a carregar o elevador, e enquanto caminhava pela rua imaginava um provável diálogo prévio:

—Vem me ajudar a pegar os embrulhos.

—Mas espera um pouco, tenho que me vestir.

—Não precisa, venha logo, quem iria entrar no elevador a essa hora da tarde? Desce e deixa de preguiça.

E cumpria-se a estranha expectativa de ocorrência dos fatos mais improváveis exatamente no momento errado.