As Refeições

Durante a minha vida, os alimentos e a sua confecção, tiveram e têm um significado muito especial. Para além da necessidade de comer para me alimentar, também lhe presto um culto que poderá se entender por gulodice, mas não, é muito mais do isso. É experimentar e desgostar cada pedacinho de certas iguarias, apreciar os diversos pratos que de norte a sul Portugal é riquíssimo e nos transportam para um patamar mais alto, onde o paladar se extasia com determinados sabores.

Ora bem! Por essa razão, nunca recusei o convite para um casamento ou baptizado ou ainda, um encontro de amigos para saborearmos determinado acepipe. Por toda essa disponibilidade, sabe Deus os barrêtes (fraudes, enganos, sobre comida mal confeccionada) que enfiei nesses convites.

Casamentos em que a comida era servida em pé, os chamados «copo dágua» onde as pessoas, quase como animais famintos, se atiravam às sobremesas, antes de começarem pelos pratos principais, emporcalhando as travessas que seriam para no fim dos pratos quentes, todos se servirem. A ponto de eu dizer que a casamentos assim, eu não ia. Mas felizmente nem tudo foi assim e guardo nas memórias gustativas certos sabores que me deliciaram.

Já deu para perceber o valor que eu dou a uma refeição, muito embora os hábitos de criança na minha aldeia não proporcionassem esse gosto. Naquele tempo, principalmente em casa de pessoas modestas, o sinal era outro. Era alimentarem bem as pessoas o que por vezes não era fácil devido à penúria da época, mas quando se convidava alguém, dava-se o melhor que se tinha e para mostrar franqueza, insistia-se constantemente que comessem, quase que obrigando as pessoas a empanturrarem-se. Era assim que era de bom-tom, insistir, insistir para que comessem.

Um dia, a minha mãe visitou-me em Lisboa e numa das refeições diárias, ela exclamou: «Oh filho! Já reparaste que nestes dias, nunca insististe para eu comer?».

Quem ficou sem pinga de sangue, foi a minha esposa, desconhecedora desses hábitos da minha aldeia.