Ela e Ele...
Ela não tinha nada a ver com nada e ele agia como se tivesse tudo haver com o tudo, ela desconhecia o mundo e ele pelo menos já tinha lido sobre aquele ou tal lugar, ela era discreta e meio tímida e ele era carismático e popular, ela tinha o sorriso fofo e as palavras doces pareciam estar sempre escorrendo pelos seus lábios e ele era meio seco e áspero e parecia gostar de distribuir farpas, ela escrevia poesia e ele tocava guitarra, ela ria alto, gostava de andar descalça e usar roupas largas e ele se importava com que os outros pensavam, media as palavras e usava as roupas mais caras, ela é gentil e ele inteligente, ela era, ele tinha, ela e ele, tão diferentes, tão distantes, tão iguais e tão próximos.
Um dia andando a toa ela esbarrou nele, ela ficou ruborizada e ele a ignorou, depois disso se encontrar se tornou rotina, ela queria vê-lo cada dia mais e mais e ele continuava com a sua vida, ela sonhava, desejava e esperava e ele trabalhava, corria a trás e o lugar mais alto almejava, ela tentou tocá-lo, tentou alcançá-lo, tentou ficar ao seu lado, correu bastante e ele friamente lhe virou as costas, ela sentiu muito e por dias chorou e ele estava ocupado, tinha muito o que fazer, e nem mesmo se importou.
Como é de se esperar ela superou a tristeza e a ferida cicatrizou, namorou alguns caras, se formou, viajou para alguns lugares e texto mais belos publicou, mas ela ainda lembrava daquele olhos distantes que um dia por ela chamou, e ele ao topo chegou, continuava correndo, ele ainda não estava satisfeito e no caos das muitas exigências um dia ele dela lembrou, e foi naquele bar, quando os amigos reclamavam de suas esposas e babavam as fotos dos filhos, entre cigarros, cervejas, reclamações, palavrões, governo, futebol e sexo uma gargalhada ele escutou e dentro dele o coração vibrou.
E sem se dar conta ele foi arrebatado por alguns segundos, ele lembrou dela e só dela, lembrou de sua ingenuidade e doçura, dos seus pés no chão, lembrou daquele vestido estampado, era tão ridículo e mesmo assim não tirou dela sua beleza singela, ela estava linda e radiante naquele dia, com o cabelo voando com o vento, os dentes brancos, cheia de palavras fáceis e românticas, lembrou do beijo, na hora foi assim, meio sei lá, mas, era morno e doce, com gosto e cheiro de tutti-frutti e muito glitter, ela ria tão docemente enquanto limpava os lábios dele com o polegar e ele estava muito irritado com isso, ele lembrou do perfume, do calor, da presença e então, naqueles segundos, ela perfeita aos olhos dele ficou.
O tempo é ligeiro, não espera por ninguém, ele casou com aquela moça que seu amigo apresentou, tinha tudo para dar certo e nem por quatro anos durou, e ela foi morar fora, aprender outra língua, investir em seu livro, e algumas coisas não deram certo como ela acreditou, ela estava sozinha, ele estava triste, ela e ele separados pelo tempo, por escolhas, decisões, ela e ele, cada um na sua, vivendo como dava, se lembrando um do outro quando o coração apertava.
Então ele perguntou por ela, alguém sabia? Um disse isso, outro aquilo, mas, nada certo se mostrou, ele sonhou com ela, com o dia que ela disse que o amava e ele rindo ficou, ele acordou assustado o peito acelerado e de suas lágrimas recordou, a boca ficou amarga, não queria nisso pensar era melhor ir trabalhar, e ela do outro lado do mundo com saudades de casa e amigos contava nos dedos a hora de retornar para o lar.
E hoje é domingo e ele não conseguiu dormir bem, o apartamento é frio e cinza, está difícil se acostumar, está enjoado da vida, irritado com o trabalho, preocupado com as contas, com a pertubação da ex mulher, de saco cheio dos amigos e hoje escolheu caminhar na praia pra cabeça esfriar, o vento estava diferente hoje e parece sussurrar em seus ouvidos: um dia ela te amou! Ele estava distraído, a cabeça zunindo, com vontade de o mundo todo esmagar e andando sem destino foi com ela que ele foi cruzar.
Ela esta sentada na areia, cabelo bagunçado, com uma saída de praia esquisita lendo um livro qualquer, esta tão feliz por estar de volta, mastiga lentamente uma barra de cereal, tinha engordado e precisa maneirar, então ela o viu de longe e logo o reconheceu e timidamente para ele acenou, ele estava perdido, os mesmos olhos distantes, seus pés pareciam pesados e assim ao lado dela chegou, ela o convidou para sentar, corações acelerados, tinham que se segurar e no meio do nervosismo do encontro ela deu aquela gargalhada e ele meio sem graça por dentro se perguntava como isso chegou assim a ficar.
Ele olhava para ela e nada mais parecia enxergar e ela sorria corada debochando do mundo e das peças que gostava de pregar, ele perguntou sobre marido e ela disse que de um não precisava, ela perguntou sobre a esposa e ele nem quis comentar, resumiram um pouco suas vidas, tinham tanto para falar, ele via o brilho de seus olhos e nada no mundo mais belo lhe pareceu e ela nadando em seus olhos distantes, com um sorriso largo e triunfante pensava: que bom, esse idiota finalmente entendeu!