- À espera de um Título
As cartas nunca negaram recomeço, fui bem mais escrita do que a pena possa transcrever. Mas nem as pautas saberiam guardar o que não podia esconder. Dos motivos que me trazem à essas calçadas até os pés sabem de có.
Nem os “Bom dia” que enviei sem pudor, nem os “Boa noite” que recebi sem calor, parecem se encaixar nesse tédio de sofá. As madrugadas que se passaram estacionaram logo à frente. Durmo pra correr do tempo, ou pra fazer com que ele corra, ficar acordada me cansa as púpilas.
Fiz da minha porta, livro de visitas, meu cobertor mais parece labirinto que não consigo sair, não tenho sonhos, devo estar cansada demais para passear por onde gostaria de estar, por quem gostaria de ser, até você esqueceu de assinar o livro.
A transpiração das mãos é só mais um dos inúmeros impedimentos que não me permitem escrever levemente alegrias, tristezas ou decepções. Não precisei de muitos rabiscos, executar palavras por imensos meios, nada mais que um curto espaço-tempo, para juntar algumas dezenas de letras e me escrever em meias palavras, sem a menor preocupação com os dicionários, caligrafia ou os verbos que acompanha a literatura dos olhos.
O fato é que a obra que fica sem título vai permanecer nesses baús, se alguém quiser roubá-la das poeiras para si, então que seja assim da sua autoria. Não esqueças dos poucos; “Bom Dia”, e daqueles; “Boa Noite” ou das cartas sem selos, embora tenham sido poucas entre muitas, precisará de bem mais que uma assinatura no final do livro, para que os olhos acreditem no título.
Nunca neguei minhas falhas ou os poucos talentos que trago, acho até injusto demais não citá-los, injusto também seria não deixar duas ou três linhas, para que alguém que venha por aqui complete ou retire o que foi dito. Cuida para não deixar muito extenso, para não fugir da realidade ou para não deixar o corredor negar todas essas letras.
Denunciei algumas saudades, sou suspeita de alguns amores, antes de pensar em riscar os muros, anunciei sentimentos e renunciei orgulhos. Nunca falei que sou ou fui perfeita nesses assuntos que enganam o coração, mas imperfeição talvez seja o bocal da caneta que escreve em ordem as emoções desejadas.
As caixas empilhadas sobre o guarda-roupa mau humorado, estão lá para biblioteca da mente, se quiser realizar alguma pesquisa, vasculhe algumas delas, não todas, se não as idéias tropeçam e o plágio sentencia: clonagem de sentimentos.
Os olhos que constantemente lêem essas escritas mal feitas e desajustadas, podem por vez ou outra as reconhecer, dizer que já viu algo parecido ou frase idêntica em algum lugar, reclamar das calçadas, dos ciúmes, dos desapegos, ou se recordar desses erros, se caso isso ocorra sorria sutilmente e diga que foi apenas um Dé javú.
Meus amores permanecerão nas minhas páginas, não quero que outros olhos se encantem por eles, a minha identidade não permite essa obra de caridade.
As entrelinhas continuarão guardando as traduções e razões das letras, caso queira saber, precisamos de um pôr-do-sol e uma mesa de bar, mas, sem caneta e papel à mão, o que elas irão revelar, nem os livros suportarão guardar.