Rio Gavião.
Rio Gavião.
Eu me lembro que era mês de agosto, porque tinha se espalhado a noticia de muitos cachorros doido perdidos nos arredores da Fazenda Lajeado. A gente por essas bandas não sabe muito bem as mudanças de tempo; verão, inverno, outono e primavera, é coisa pra estudioso que sabe o que lê, mas na pratica é danado pra dizer besteira. Aqui nós não temos chuvas no inverno que é muito quente durante o dia, e frio durante a noite; nessa época por aqui as quadras de lua são bem visíveis, e dá pra gente contar as estrelas dos céus em todos os seus quadrantes. As noites são escuras quando a lua é minguante ou nova, mas nas noites de lua cheia dá gosto a gente ficar sentado na frente da paiada, apreciando o nascer da lua por detrás do Morro da Balança. E de vez em quando uma estrela cadente riscando os céus de ponta a ponta, deixando atrás de si uma chuva de pontinhos luminosos que a gente nunca sabe onde cai. Ai mãe veia dizia: __”faça um pedido, faça um pedido;” não sei pra que, nada do que a gente pedisse iria chegar ali naquele fim de mundo.
Noticia ruim chegava; quer ver só; quando a filha do finado Rochael inbuchousse, meu irmão que tava em São Paulo ficou sabendo da noticia primeiro que nós. É, e foi ele que nos escreveu contando a novidade; que quando Rochael, o pai da menina ficou sabendo, não deu nem pra contar os detalhes, morreu ali mesmo de mal súbito. Naquele dia eu percebi que o vento tinha mudado de direção, e as nuvens mais escuras começaram a surgir no quadrante norte anunciando chuva. O Rio Gavião estava seco já a mais de dois anos pela longa estiagem; eram poucas as cacimbas abertas no seu leito arenoso que ainda tinham um pouco de água. Somente aquelas abertas próximas ao barranco. O rio Gavião não é um rio; pra nós aqui no sertão ele é simplesmente uma grande enxurrada que desce das encostas do Morro dos Macacos quando ocorrem grandes chuvas. O Morro dos Macacos é uma formação rochosa no formato de um grande “U”, com algumas grutas que se formaram através dos anos, e dali nasce o Rio Gavião que se farta de água nas épocas chuvosas. A sua enchente dura poucos dias, e passado o período chuvoso lá está ele seco novamente. E lá vamos nós abrir cacimbas em seu leito arenoso, até que venha novamente uma nova chuvarada. Nunca ouvi ninguém dizer que um dia o Rio Gavião será perenizado. No dia que isso acontecer, o sertão vai virar um paraíso.