Pãozinho com manteiga
Raiado o dia, saio de casa cedinho rumo à padaria próxima. Caminho sem pressa, dobro uma e mais uma esquina. Passos rápidos me ultrapassam ou por mim cruzam, indiferentes a certos encantos desta curta caminhada. Nos jardinzinhos das casas, pétalas coloridas, despertadas, dão um "bom-dia!". Árvores espreguiçam seus galhos, de onde já caem as primeiras folhas outonais, que uma brisa as rodopia ao léu. A música da passarada saúda um novo alvorecer.
Aos poucos, me incorporo à crescente agitação. Ao aproximar-me da avenida a cruzar, o forte contraste. Veículos comprimidos no nervoso trânsito, impacientes buzinas ante o farol vermelho. Pedestres apressados, muitos com o celular atrelado aos ouvidos, atropelam-se e se trombam nas calçadas; outros se arriscam no amarelo. Pergunto-me o porquê desta sensação de atraso e premência que se apodera das pessoas, no frêmito matinal da metrópole.
O formigueiro humano se avoluma, ônibus passam plasmando corpos, motos serpenteiam ousadamente. Novamente me questiono como o "tal" progresso atingiu este ponto, quantas necessidades criadas, em maior número que confortos, que justificariam tal buliçosa agitação. Valeria mesmo a pena? "Tempo é dinheiro.", diz a máxima capitalista. Concordo e discordo, para sentir-me ainda parte desta "moderna" sociedade.
Adentro a padaria. Fila para comprar, fila para pagar, cartões e senhas a lembrar. Saio com meu saco de pães, cheirinho da infância, logo desfeito na rua pelos escapamentos. Tomo o caminho de volta. Entro nas ruas laterais, onde ainda se ouve o canto já um tanto rouco dos pássaros, vindo de árvores e de fios onde aprenderam a se equilibrar, por escassez de galhos, talvez...
Olho o céu zangado, acinzentado. O pincel da Natureza não mais consegue pintar o azul sobre a paisagem de cimento.
Tudo pelo simples prazer de um cafezinho caseiro, com aquele pãozinho ainda quente com a manteiga derretendo...
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