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AFINAL, DASDÔ DEU OU NÃO DEU?
 
                                                                      Para meu amigo poeta e escritor Geraldinho
                                                                     do Engenho, mestre e admirador dos diálo-
                                                                     gos caipiras, sertanejos etc.
                                                                                                                                               



 
Há dias Camilo vinha aborrecido; certa coceira repentina o acometera sobre a fronte, incomodando-o. Virava e mexia, lá estavam as unhas no local; antes, começara sem que ele se desse conta, coceirinha miúda, de espaços prolongados que não lhe cobrava atenção. A semana passou e nova preocupação o tolhia; uma preocupação que, ao contrário do incômodo na fronte, até que o agradava: por aqueles dias aguardava a chegada da mulher; Maria das Dores, a Dasdô, o prevenira da vinda. Três meses os separam.
A ansiedade o carcomia. Como faria caso ela chegasse durante o dia? Novo no emprego constrangia-o a liberdade de pedir favores.  Todavia, vindo sozinha, Dasdô se perderia desnorteada em meio da efervescência da rodoviária, e mais ainda nos meandros da grande cidade; afligia-o ver a mulher naquela situação. Por outro lado persistia a insegurança de falar ao chefe.
De volta do trabalho, amofinava-se com o problema; porém, ao se aproximar da casa um envelope sob a porta o atraiu. Era de Dasdô.  
Leu-a ao gosto da ansiedade pela chegada da mulher e pela aflição em falar ao chefe. Finalmente entendeu que sua preocupação não mais fazia sentido.  A mensagem dizia que Dasdô adiaria a viagem por dez dias, pois viria em companhia do primo Zé das Neves juntamente a mulher do próprio; viajando na condução do casal dentro de três dias estariam na cidade; no mais, que ele aguardasse a informação do futuro ponto de encontro e o horário.
Respirou aliviado. Agora teria tempo para ajeitar as coisas, não dependendo de favores no emprego.
E assim, nosso bom Camilo focando sua atenção nas demais atividades que naturalmente adviriam, tais as de dotar a pobre moradia do elementar para o dia a dia dos visitantes, fora surpreendido pela data fatal.
Do trabalho para o combinado; 7;00 h lá estava o Camilo aguardando os viajantes que pouco atrasaram.
--- Uê?... vei só os dois?!!! 
--- Viemo!... Eu e ela!
--- E sua muié, pruque num vei?
--- Pruque num quis.  Zé das Neves deu de ombros.
--- Treis dia de viage... só os dois e num me avisaro, é?
--- O qui teim isso, home!
---  E posaro onde? A desconfiança alfinetava com maior profundidade o homem.
--- Posemo em Brejim e nas Trêis Irmã.
--- Em Brejim e nas Trêis Irmã?!!!... Torraro u’a nota, hein?
--- Mai fiquemo só num quarto.
--- Só num quarto?!!! ... Os dois?!!! Camilo sentiu uma agonia se apoderar dele; sem saber por que, levou as unhas a coçar a fronte.
--- ???
---- E cuma foi esse poso?
--- Ora, cuma foi o poso! Zé das Neves começava a dar sinal de irritação.
--- ... Drumimo junto, ó xente!
--- Intão é o que penso?
--- Se é que drumimo junto, é isso.
--- Eu sei muito beim que ocêis drumiram, Zé das Neves... eu quero sabê é cuma, intendeu?
--- Ora se num intendi, home!... Drumimo no memo quarto e na mema cama!
--- Na mema cama?!!!
--- Sim, na mema cama!... ocê sabe quanto era pagá dois quarto, sabe?
Camilo pensa; por ora coça a cabeça; a dúvida o conduz novamente ao cerne de sua desconfiança.
--- Inda me diz qui drumiram junto...
--- ???
--- Dasdô, careço ixpricação!
--- Diga  qui lhe dô. A mulher entra na conversa dos dois homens.
--- O qui ocê deu a ele?
--- Cuma assim?
--- Num se faça de tonta, muié!
--- Home!... ocê tá malinano de eu, tá?...Me respeite, hein?!!!
--- Dasdô óia pra minha cara!... O qui ocê vê, muié?
Dasdô o olha o choramingas Camilo sem nada dizer.
--- ... Me acha com cara de bobo, é?
--- De bobo não, de corno sim!... ocê se acha!
--- Dasdô... óia qui não sô homi de levá disaforo pra casa!
--- Da mema forma que eu, muié, também num levo!
--- Óia bem nos meus óios, muié... jura pelo padim qui num foi usada, jura?
--- Juro pelo padim, e por todo us santo de prantão no céu, qui não!
Ante a afirmação segura de Dasdô, Camilo lança um olhar de desprezo ao primo e... capitula.
--- Oh, Dasdô, passa pra cá muié... coisa minha! Caminha que tô arretado mode tu!
Não é preciso grande coisa a contentar uma necessidade prolongada. Ao saírem, Dasdô deu uma piscadela a Zé das Neves; à noite, teve de arregalar os dois olhos de prazer ao marido carente.
Zé das Neves amargou a noite fora da casa. “Drumiu” no carro mas o pensamento estava aceso nas camas de Brejim e Três Irmãs.
 
 
moura vieira
Enviado por moura vieira em 20/03/2013
Reeditado em 16/03/2021
Código do texto: T4198507
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