"Recordações de uma menina"-Capítulo 1

SÉRIE RECORDAÇÕES DE UMA MENINA

CAPÍTULO I

Década de 30

Bairro Ipanema

APRESENTAÇÃO

Lembro- me bem o dia em que comecei a fazer o que sempre tive vontade, escrever. Desde criança, ao abrir qualquer livro tinha a nítida impressão que ia entrar num mundo encantado, cheio de histórias diferentes e maravilhosas.

As recordações eram e, são ainda, muito intensas, principalmente em se tratando de assuntos tão queridos, mesmos já tão distantes... Sempre quis escrever a respeito deles todos, que povoaram minha infância e deram cor aos meus devaneios infantis: meu lar, meus pais e irmãos.

Nossa família era uma das comuns, pai muito inteligente, calmo, mãe enérgica, eficiente, cuidadosa e irmãos que me traziam imensa alegria de criança, em que os sonhos infantis eram compartilhados amigavelmente. Às vezes os sopapos comiam feios e fortes, mas depois amainavam e estávamos logo tagarelando, normalmente, como se nada tivesse acontecido.Não havia um só dia em que não acontecessem fatos diferentes. Parecia que íamos em busca de novidades , mas não, elas é que vinham ao nosso encontro para dar vida e cor ao cotidiano.

Muitas vezes eu ficava pensando se era assim mesmo em outras casas. Sempre tive a mania de pensar. Por tudo eu ficava pensando, imaginando coisas que nem mesmo, na época, sabia o que era. Aí fantasiava muito, o que toda criança faz, dando tratos à bola, medindo e criando situações. Em casa, os meus irmãos eram totalmente diferentes. Agiam como se fossem adultos apesar da pouca diferença de idade e, assim, eu me sentia a própria boboca, jogada pelos cantos da casa, mas o que não podiam imaginar era que eu era muito mais esperta, mais sagaz e mais inteligente, apesar de tudo... De tão boazinha, porque era a única menina, era muito explorada, até que um dia resolvi me modificar, lutar e medir forças com eles. Sempre saia vencedora, pois minha mania de pensar me fazia analisar mais e avaliar as coisas que me poderiam favorecer. Depois era um bate boca danado, com acusações de trapaceira e outras coisinhas mais. Nem ligava mesmo, porque o que achava é que eu era a heroína, a campeã das lutas de quintal, das batalhas imaginárias com final sempre feliz para mim, claro.

Tínhamos um grupo de amigos constituído só de garotos, natural, eu é que era o invasora. Isso me machucava muito, por que tinha que ser assim? Mas minha mãe sempre repetia que eu era uma menina e tinha que me portar como tal. Que raiva eu sentia! Brincar de boneca, enquanto ficava ouvindo o vozerio deles nas brincadeiras de mocinho, bandido, de pular carniça e soltar papagaios. Eu me sentia muito triste, mas que fazer? Quando minha mãe relaxava um pouco, corria pra junto deles pra tirar a diferença e era muito bem aceita. Minha vivacidade, alegria e entusiasmo contagiava-os e ficavam também muito felizes.

Meu irmão mais velho, Rubio, com a diferença de idade maior, resolveu ficar de fora dos folguedos para me proteger dos outros, com cuidados incríveis, deixando até de compartilhar do grupo dele, para me dar apoio e incentivo. Foi sempre assim, como sentia responsabilidade em me dar segurança... Pelo menos fomos assim em criança.

Murillo, meu irmão dois anos mais velho, era o que mais próximo ficava, apesar de ser totalmente diferente de mim. Era caladão, quieto mas muito ladino e envolvente. Era muito calmo, mas explorador, me cativava com palavras fáceis e eu caia que nem patinho. Éramos inseparáveis nos folguedos infantis e nas travessuras. Como conversávamos, como nos entendíamos... Chegávamos a ser inseparáveis.

Meu pai era jornalista, poeta, escritor e artista. Curtia adoidada as conversas dele, sempre muito inteligentes e cativantes. Trabalhava o dia inteiro sem parar, vinha em casa para almoçar e só voltava às 10 horas da noite, hora que jantava com minha mãe. Nos fins de semana é que ficávamos mais próximos, aos domingos principalmente, depois da missa, saíamos os dois andando e conversando. Eu, tagarelando, contando as novidades da semana e da escola e ele ouvindo atentamente, rindo muito das minhas expressões e conclusões.

Éramos muito parecidos, não só fisionomicamente como em quase tudo. Minha mãe era a bondade personificada. Muito mais moça que ele, mas se entendiam muito bem, pelo menos era essa a imagem que nos passavam, sempre uma cortesia e um carinho entre eles. Cuidava da família, da casa e de tudo que se se relacionasse ao lar. Vidinha comum de pessoas comuns, era a nossa.

Essas são as características que posso descrever da minha família.

Myriam Peres

http://www.myriamperes.mayte.us

segue

Myriam Peres
Enviado por Myriam Peres em 11/08/2005
Reeditado em 11/08/2005
Código do texto: T41985