UM GÊNIO...

Ponderei por anos e anos se deveria descrever essa sarcástica e inusitante narrativa. Não sei porque esperei! Já deveria ter escrito.

Caro leitor. Peço-lhe atenção e entusiasmo em sua leitura, poupe-se de meus detalhes sórdidos, desculpe-me se tornar-me um soporífero, mas, o que vou lhes narrar é a mais pura verdade... Acredite! Em nenhum momento tornarei-me falaz, quimérico.

Possuo eu, um tio-avo que, aos meados de seus joviais oitenta e nove anos de idade, de pura astúcia e severidade, mantém regularmente relações sexuais. Isso mesmo! Regularmente relações sexuais.. Nunca disse-me seu segredo, eu particularmente duvido, renego, mas nunca posso deixar de acreditar.

Conta-me ele que, em seus infantis vinte anos, relacionava-se sexualmente quinze vezes por semana. Como era um menino na flor da idade, como refere-se, e com muita energia, mantinha relações com mulheres, ovelhas, vacas, éguas, cabritas, etc.., mas o que mais gostava, sem dúvida nenhuma, eram as mulheres. Era astuto, boêmio, sagaz. Considera-se um Don Ruan.

Gaúcho nato, interiorano, conta-me que foi jogador de futebol, um zagueiro, um zagueiraço, com cara e jeito de mau. Rosnava. Pois todos bem sabem que zagueiros rosnam. Ele era um desses. Um durão. Mas quando tratava-se de mulheres ele tornava-se um centroavante. Oportunista, malicioso, conversador.

Todos tinham medo, as mulheres paixão. Todos seus amigos eram fracotes e magrelos, ele era fortão. Era domador de cavalo xucro, e como contam pela cidade, nunca deixou cavalo redomão. Aliás, nunca teve potro que tenha lhe derrubado. Nunca!

Não freqüentou escola, mas conhece e faz uso das palavras mais lindas. É conhecedor e degustador incontrolado de cachaça, vinhos e wisky importado. Fala e ronca grosso com os homens, é cordial e maleável com as mulheres. Nunca saiu de sua cidade, mas conhece todas as grandes cidades do mundo. Casou-se pela primeira vez aos cinqüenta e dois anos, mas nenhum dia de sua vida ficou solteiro. É poeta e escritor. Gosta de música nativista e música clássica, rock e pagode. Gosta de loiras e morenas. Nunca teve filhos, mas criou enteados e sobrinhos. É do signo de aquário, mas tem um gênio de escorpião. Sempre anda armado, mas nunca atirou em alguém. Já foi preso e castigado. Capotou carros, ficou quatro dias sem dormir, roubou dinheiro da caixinha da igreja, já dançou pelado, freqüentou cabaré – aliás, já namorou todas as mulheres do cabaré da cidade – já surrou o vizinho (quinze vezes). Fuma paero, charuto e cachimbo, mas orgulha-se de nunca ter colocado na boca cigarro vendido em maço. Já namorou seis de suas primas, sendo que todas se apaixonaram. É romântico e rude. Manda flores, sustenta amantes, canta e toca violão, assovia comendo farinha, bate com as duas pernas, etc... Vou parar de citar suas bem feituras por aqui.

Gosto de conversar com meu tio, ele é um mestre, é um gênio. É entendedor da vida, conhece-a como ninguém.

Quero ser como ele, viver como ele, infundir-me na sua inocência, na sua paciência, em seu jeito manhoso de levar a vida.

Sei que não serei, ninguém será. Igual a ele somente ele. Não é o melhor, é apenas o único.