Eu conheci o motorista do Papa

 
Lá pelos anos 50, estávamos longe de ouvir falar em papamóvel, é claro, isso é coisa moderna. Papa circulando por ruas apinhadas de gente a querer vê-lo e tocá-lo não passava pela cabeça de ninguém, cristão ou ateu, islâmico ou judeu. Sua Santidade não saía de seus domínios. Quem quisesse ver o Papa que fosse a Roma.
 
Mas certamente havia carros no Vaticano. Para servir aos cardeais, bispos e arcebispos. E também para que o Sumo Pontífice pudesse se deslocar de um lado para outro lá dentro mesmo, ou se transferir para Castelgandolfo durante o verão, como ainda é tradição.
 
Fiquei pensando nisso tudo porque outro dia me lembrei de um fato que volta e meia me vem à memória. Nada importante, mas de certo modo singular.
 
Naquela época estava eu pelos sete ou oito anos, quando um tio-avô, que eu pouco via, esteve por aqui em visita a minhas tias. Fui xeretar e até me fizeram beijar a mão do senhor de barbas longas. Atordoada no meio daquela gentarada, deixei a sala e me esgueirei para a cozinha. Lá encontrei as empregadas alvoroçadas. Mas a agitação não era por causa do almoço extraordinário, logo percebi. É porque ali estava um homem, nem velho nem moço, de semblante humilde, porém de terno e gravata, a contar-lhes algumas bravatas. Falando enrolado e meio cantado, o chofer do meu tio encantava a mulherada. Dizia-se recém-chegado da Itália. Motorista de profissão, muito trabalhador, tanto lá como cá, sempre prezou seus patrões. Agora servia ao signore dottore, mas antes, lá na sua terra, já havia conduzido um uomo importantíssimo, especialíssimo, beatíssimo: o Papa Pio XII.
 
Se a história é verdadeira ou não, nunca vou saber. Criançona, não perguntei nada a ninguém, simplesmente acreditei. E achei o máximo conhecer o motorista do Papa!



 
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Pio XII: Foi papa de 1939 a 1958
Eugenio Pacelli
(2/3/1876 – 9/10/1958).
Nasceu em Roma e morreu em Castelgandolfo



(*) texto publicado no RL em abril/2009