SUSTOS (III)

SUSTOS NO TRABALHO

MUDANDO DE FUNÇÃO

A empresa inesperadamente ficou sem um responsável pela tesouraria.

O gerente administrativo reúne-se com o gerente de recursos humanos e este aconselha a minha ida para tesouraria e em meu lugar ficaria meu auxiliar e contrataria um auxiliar para o mesmo.

Então eu fui para a Tesouraria. A sala da tesouraria era a última e sua grande janela de parede a parede, sem cortina, fica voltava para um viaduto a menos de uns 20 metros. Quem passava pelo viaduto via a gente contar o dinheiro. Um prato cheio para ladrões. À noite com as luzes acesas eu não via nada lá fora. Comecei a sentir medo, também não havia cofre. A parede que estava atrás de mim tinha uns 50 ou 60 cm de largura e foi lá que instalaram um cofre de parede. Por um lado o dinheiro estava mais seguro, mas a existência de um cofre era um chamariz para assaltos.

Existiam duas salas vagas no prédio, uma no centro em posição e tamanho ideais e outra na face frontal do prédio voltada para a rua. Na sala central o gerente de vendas vetou, porque ele já tinha escolhido para a “escolinha”. Então fiquei com a outra. Eu e minha auxiliar ficamos com as costas protegidas pela parede. Entre mim e ela havia uma grande janela fixa. Mas mesmo assim dava medo de trabalhar fosse ao transcorrer do dia e principalmente à noite.

Num sábado, pela manhã, eu fui trabalhar e como sempre absorto na papelada (levei um ano para resolver as pendências) sou surpreendido com tamanho estrondo na janela. Parecia que tinham atirado uma enorme pedra. Atirei-me ao chão e fiquei debaixo da mesa. Simplesmente, era o encarregado da limpeza que do lado de fora apontou o esguicho para a janela e abriu o jato. Todos que trabalhavam na empresa tinham medo. O local à noite era frequentado por gays e prostitutas e a freguesia vinha do Ceasa. Assaltos e agressões eram frequentes. Nós da tesouraria conferíamos e guardávamos a féria da rota (venda em domicílio) em um grande cofre bem pesado para ser depositada no dia seguinte.

Todos viam os furgões chegarem para prestar conta. O medo de assalto era cada vez maior. Até que o depósito passou a ser feito diretamente no banco e a prestação de contas era feita mediante o recibo de depósito.

Um dia vieram os auditores externos e perguntaram a mim se eu mantinha o segredo do cofre permanente.

- Só à noite, disse eu, porque enquanto há gente aqui e aparecer alguém e te apontar o revolver, a gente esquece até o próprio nome. Deu muito que falar, mas nossos argumentos venceram. Trabalhar sob o domínio do medo é improdutivo e estressante.

O PARDAL TRAPALHÃO

O gerente administrativo, dono da cadela, pedira demissão e para o lugar dele veio outro, “coincidentemente” também era argentino. Mas este já estava abrasileirado, já havia vinte anos que deixara a Argentina e conhecia bem os costumes brasileiros. Trabalhou apenas um ano, chegava antes das oito e saia depois das vinte horas. Consertou a casa. Colocou cada macaco em seu galho.

Um dia eu estava despachando em sua sala no primeiro andar e vi um pássaro que vinha na direção do prédio. Era apenas um pardal. Creio que na visão do pardal, a vegetação se espelhava no vidro da janela e ele foi direto contra o vidro, fazendo um bom estrondo.

Embora sentado, o gerente apavorado se atirou ao chão como um goleiro em defesa de um penal. Então eu lhe contei os meus três sustos anteriores. Ele também trabalhava sob o domínio do medo. Foi então que chamou os encarregados e começou a pensar no plano de reestruturação e mudança de local.

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 13/03/2013
Código do texto: T4185984
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