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NUNCA AOS DOMINGOS

 
Esse era o dia de Da. Lícia morrer?  Há tantos dias na semana para morrer, e ela acha de morrer logo hoje? Com tanto sol, tantas expectativas festivas para o aniversário do Thiago, por que morrer justamente agora?
Pode parecer despautério, mas pessoas deviam ser proibidas de morrer aos domingos.  Domingo é dia de ir à missa, frequentar cultos, comer macarronada com frango caipira!... Imagine morrer num dia desses!
Mas não. Lá estava ela, Da. Lícia, a que morreu num domingo, certamente com o gostinho de um caipira na boca. Hirta e fria, inundada por rosas brancas e amarelas, cobertas por transparente envoltório rendado em volta da urna; ladeiam-na homenagens traduzidas em generosas ramagens de ciprestes convertidas em coroas, com os dizeres: “Eternas Saudades dos Vizinhos”, “Lembranças da Família Tal” ,etc. Filhos choram, rentes; próximos,  parentes se comovem e conversam: os demais, à distância, gesticulam e sorriem, como nos desinteressados e incrédulos velórios atuais. Sentado, observo a todos e a tudo, até mesmo o convidativo sol da tarde, que o domingo irradia com fartura. Surpreendo-me, pesaroso, a pensar no que estou perdendo no Thiago.
As salas de velório contíguas estão às moscas; somente Da. Lícia houvera morrer no “imorrível” domingo, para aborrecimento também dos coveiros.
Por que não na segunda-feira? Dia de todas as lástimas e de todas as descrenças?  A 2ª., sim, seria o dia ideal para que o Senhor, com toda a sua benevolência e sabedoria ,encaminhasse as benditas almas ao céu.
Aos domingos, já dizia Chico Anísio, caberia somente as mortes e os enterros de anões.
Você, por acaso, já viu um? Perguntava ele, incrédulo.
 
moura vieira
Enviado por moura vieira em 10/03/2013
Reeditado em 15/07/2021
Código do texto: T4181020
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