Porque bicho-doido??!!!
Fins da década de 40. Na baixada maranhense, quem tinha um cavalo, tinha um carro popular. Quem tinha dois cavalos, tinha um carro melhor. Quem tinha vários cavalos bonitos e bem tratados, tinha uma ferrari.
O jovem alto mulato forte briguento e mulherengo, conhecido na cidade, coleciona bons cavalos.
Não é rico, nem alfabetizado, mas sua mania de colecionar cavalos, angaria simpatias entre as moças e desafetos entre os rapazes.
Anda pela cidade em velocidade, montado em cavalos que baralham*, e dado o bom trato que recebem e os arreios e selas bonitas, chamam a atenção.
Dias de festejos de entidades religiosas, e as moçoilas se esmeram no preparo, afinal aqueles eventos - após a missa - tornam-se as ocasiões festivas que elas podem usufruir e testar seus dotes de coqueteria. Seriam os shoppings-center e barzinhos/lanchonetes da moda, de então.
O nosso herói se prepara, emplastra o cabelo de brilhantina, aquela da propaganda dos conhecidos 'Almanaque Fontoura', que dizia “Aqueles que brilham com glostora”. E brilhava mesmo porque era generosamente aplicada a fim de dar uma forma elegante aos rebeldes, volumosos e crespos cabelos mulatos dele.
A calça de linha branco, brilhando de tão engomada e larga como ditava a moda, é presa em um cinto preto e acompanhada de camisa de manga comprida em sóbrio cinza.
Na cintura a peixeira com cabo de madrepérola em bainha de couro trabalhado, comumente usada então, não era portada com intenções beligerantes, mas sim porque havia capoeiras, sendas margeadas por matagal espesso onde habitavam cobras, e a arma era defesa contra animais nocivos.
É a própria elegância e está preparado pra caça. Não tem rivais pois sua ferrari - cavalo baio bem escovado, de crina fulva penteada, rabo longo bem tratado, com arreios, sela e outros componentes de couro brilhando, completam a figura.
Porém o destaque dessa figura era seu apelido, produto da própria auto-propaganda que ele fazia acerca de seus talentos enquanto cavaleiro e conquistador de plantão.
Quando assim preparado e se dispunha a sair de casa, lançava seu grito de guerra que acabou por cunhá-lo, e era ouvido por toda as redondezas:
Quando eu monto um cavalo baio, eu sou bicho-doido!
E em cadenciado trote, saía com o fogoso cavalo de pescoço retesado e num passo baralhado, que chamava a atenção pela beleza e postura do animal – a ferrari.