Tempos modernos ou problemas arcaicos: a escassez de livros e livreiros

Ontem, caminhando pelas ruas do comércio da cidade de Praia Grande-SP pude constatar o quanto se torna difícil para um indivíduo situado aqui alimentar e saciar a sede de leitura, quando não se encontra oportunidade para a aquisição de livros em lugar nenhum praticamente. Para deixar um pouco mais claro, pude vislumbrar a escassez de livrarias naquela cidade ou mesmo de venda de livros de bolso em bancas de jornal do centro e das ruas principais.

Tenho que declarar, logo de cara, que o que me levou a esta descoberta foi uma situação que acredito poder acontecer com qualquer sujeito leitor ou apreciador de literatura. Naquela manhã, acordei com uma vontade enorme de ler textos poéticos de autores brasileiros da segunda metade do século XX e um nome forte me veio à mente rápido: Mário Quintana. Mas estava bastante flexível devido à louca vontade de ler poesias, então, naquele momento poderia ser um outro autor qualquer que me despertasse interesse ou mesmo curiosidade. Contudo, parecia isso ser a coisa mais complicada naqueles instantes, devido à falta de um estabelecimento comercial que vendesse livros.

Andando pelas ruas repletas de lojas diversas onde se poderia facilmente comprar roupas, joias, celulares, artigos de decoração doméstica e vários objetos de utilidade em um dia na praia, já que se tratava de uma cidade praiana, não encontrei nada ligado a uma boa leitura ou às artes das letras. Verifiquei em algumas bancas de jornal se tinha uma venda regular de edições de bolso, coisa comum em outras cidades, mas, infelizmente, só encontrei revistas variadas e gibis, além, é claro, dos habituais veículos de comunicação impressa da região e do estado de São Paulo. Mas nada de Literatura.

Quando me cansei um pouco e senti sede fisiológica, resolvi procurar logo algum estabelecimento de bebida natural. Deparei-me em poucos instantes com uma barraquinha improvisada no fundo de um carro que vendia caldo de cana. Como aprecio a bebida tanto quanto uma boa leitura, não pensei duas vezes e parei para consumir. Após matar minha sede e provar aquele caldo delicioso, bati um papinho com o vendedor local e perguntei se ele poderia me informar a direção de alguma livraria por perto ou mesmo um pouco mais longe. Primeiro, ele disse que estava difícil e, logo, numa conversa que desenvolveu tranquilamente entre eu e ele, pude perceber que a compra de livros por ali não parece ser uma prática comum mesmo. O vendedor de caldo de cana, simpático e atencioso, informou-me que livraria só, quiçá, do outro lado da cidade num bairro chamado Boqueirão. O detalhe é que fica um bocado distante daquele local (Cidade Ocian). Aí ele me fez algumas perguntas do tipo: “você está interessado em abrir um negócio disso aqui? Adianto logo: você vai morrer de fome!”

Despedi-me daquele comerciante caiçara e continuei minha peregrinação na busca de alguma evidência que provasse o contrário. Realmente não encontrei nada por ali. Na volta para o lugar onde estava passando meus dias naquela cidade, encontrei uma loja da rede franqueada “Americanas” e pensei que pudesse, ali, a exemplo das outras lojas da mesma rede, encontrar algumas edições de Best Sellers e livros de autoajuda por preços bem camaradas. Com certeza os encontrei ali bonitinhos numa prateleira bem próxima aos DVD’s e CD’s. Prática padrão do marketing comercial daquela empresa. Mas ainda que garimpasse naquele meio algum livrinho legal como uma edição que encontrei de O Poderoso Chefão, por exemplo, não era o que realmente buscava naquela empreitada. E também não considerava aquilo o suficiente para alimentar uma prática regular de leitura para um indivíduo morador ou mesmo turista daquela localidade. Nem mesmo considerava aquele bolinho de livros um bom pontapé para difundir o gosto pela leitura naquela região.

Ao anoitecer, saí de casa com parentes que moravam na cidade para que eles me mostrassem alguns lugares de lazer por ali além da praia. Fomos logo ao Shopping da cidade e lá, sim, pude encontrar logo uma livraria de uma grande rede nacional especializada no ramo: a “Nobel”. Adentrei aquela livraria e pude visualizar uma diversidade de títulos bibliográficos nas suas prateleiras. Mas ainda que ali contivesse uma gama variada de oportunidades de leitura para públicos interessados, inclusive com muitas edições de bolso a preços promocionais para facilitar a sua aquisição, considerei muito pouco para uma cidade daquele tamanho e com tal circulação de pessoas durante o ano em termos de difusão de leitura. É verdade que quando saímos e passamos de carro por uma avenida importante do tal bairro Boqueirão, também vi uma outra livraria da Nobel por lá. Mas foi só isso. Duas livrarias para aquela grande cidade praieira que fica entupida de pessoas durante o verão nacional e em quase todos os feriados do calendário e que, além disso, ainda comporta um número extenso de trabalhadores diversos que ralam muito para poder dar a mínima assistência aos seus conterrâneos e nós, os seus visitantes.

Com tudo que me ocorreu naquela caminhada em busca de alimentar a minha leitura, acabei ficando bastante reflexivo com a situação daquelas pessoas que estão lá e que necessitam nutrir esta prática e, para muitos, o gosto. Se eles não utilizarem a rede mundial de computadores – a internet – para buscar as oportunidades disponibilizadas atualmente, como as digitalizações públicas de textos literários possíveis, eles só vão poder recorrer às bibliotecas escolares e públicas, que também nem sei se há por ali em quantidade razoável. E ainda que existam tais, acredito que podem contribuir muito pouco para a totalidade do problema que pode se tornar em poucos anos a falta de livros e, pior, a falta de leitura.

Helder Rocha, 29/01/2013.

Helder S Rocha
Enviado por Helder S Rocha em 27/02/2013
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