O jeito que tem
Foi agora, nos meus 35, que eu descobri realmente o medo
Nunca fui dessas corajosas de dar inveja, mas sempre me virei bem.
O medo que tive era aquele de reflexo, que todo mundo (ou quase todo mundo) teria; Medo de barulho à noite, medo de machucado aberto, medo de cachorro bravo.
Fora isso, eu sempre fui a pessoa que ia até o fim. Eu que me arriscava e roubava as provas na véspera para salvar a minha pele e a de uma galera no final do ano. Abandonei um sonho chamado música, iniciando um efeito dominó impressionante logo atrás de mim. Era a companhia certa para acampar por quinze dias sem dinheiro, sem planos, só com amor.
Até os vinte e poucos anos eu era a que não tinha medo de ficar com cabelos loiros, lisos, ruins ou sem cabelos. Sabe?
Mas agora, nos meus 35 eu estou apavorada.
Porque se antes eu escolhia a cor dos meus cabelos, agora eles estão brancos sem eu escolher.
Brancos, gente.
A idade que chega depressa vem pesada. E me força a olhar para trás e reconhecer uma conduta tão destrutiva e também prazerosa, que sinto culpa.
Culpa e medo. Medo de continuar seguindo e ter que tomar novas decisões, enormes, desta vez. Há tempos, as decisões eram pequenininhas, reversíveis, era só de sacanagem, ou, pelo menos, apareciam assim para mim.
Agora não. Agora eu tenho a sensação de que o cimento está finalmente secando e se eu não tomar alguma providência rápida, ele vai enrijecer e eu não vou mais poder mudar nada. E isso me dá um medo imensurável.
O pior de tudo é que não vai ter jeito.
E o jeito que tem, eu vou ter que descobrir dia após dia, com ou sem medo, até o momento que os anos não chegarem mais para mim.