ENTRE O QUERER E O SER

Queria ser a caneta nas mãos de um poeta a escrever lindas e sinceras declarações de amor, no entanto tenho apenas conseguido ser a tinta, abandonada em algum lugar da mesa.

Queria ser o mar, infinito, pleno, profundo, com seus encantos e mistérios, com sua beleza sem igual, no entanto tenho conseguido ser apenas uma gaivota que plaina sobre a sua imensidão conhecedora que o mar é muito maior que ela.

Queria ser o céu, inatingível, azul e límpido nos dias claros do verão. No entanto não passo de nuvem, uma pequena nuvem que se movimenta ao sabor do vento e de acordo com as intempéries da natureza.

Queria ser um jardim, cheio de cores, perfumes, beleza, enchendo os olhos de todos os que passam. No entanto tenho conseguido ser apenas uma flor, talvez a mais simples, a menos importante, a menos notada.

Queria ser forte, destemido, imbatível, mas não tenho alcançado muito êxito. Às vezes sou mais fraco que deveria, e meus medos superam a minha pequena coragem diante das adversidades e dos problemas que tenho que enfrentar. Certifico-me que estou muito longe de ser alguém imbatível, e até com certa tristeza, noto que na maior parte do tempo estou sendo vencido quando deveria vencer.

Deveria amar; amar de forma intensa e plena, de forma que todo o meu ser fosse preenchido pelo amor a ponto de eu me tornar um único ser com ele. Seriamos apenas um vivendo a cumplicidade que só o amor pode nos dar. No entanto, vejo que não consigo, talvez porque a vida tenha me ferido muito, me machucado, a ponto de ter que me fazer reservas internas como se fosse um instinto de alto defesa desenvolvido a custa de muito sofrer e muito chorar.

Este sou eu, apenas a metade do que deveria ou do que queria ser. Com erros, defeitos, imperfeições. Este sou eu que não consigo atingir a meta de ser 100% porque algo me impede de conseguir. Sou eu na tentativa de ser melhor, de ser mais amplo mais completo e que, no entanto até este momento está apenas na tentativa.

A grande diferença entre querer e ser. Entre planos e objetivos e resultados. Este sou eu, tentando a cada dia e a cada dia tendo que conviver com mais uma tentativa muitas vezes carregada de frustrações e de tristeza. Queria ser muita coisa, no entanto só tenho conseguido ser metade de mim mesmo. E a outra metade, aquela que talvez seria a mais importante para mim ainda se encontra adormecida, inerte, e sem perspectiva de despertar. Este sou eu na tentativa desesperada de alcançar a outra meta, o outro lado da margem, o mais alto da montanha, e que até no momento estou sem forças até de sair do lugar. Sou eu, querendo apenas ser e até agora não conseguindo. Mas sem perder a fé de que em algum lugar, em algum momento, irei conseguir estabelecer o equilíbrio entre o que quero ser e o que realmente sou.