A gordinha, a roleta e o bêbado
Conta minha irmã Vera, que um dia estava numa naquelas viagens rotineiras, entre o trabalho e sua casa, quando testemunhou uma cena muito interessante no coletivo, como nós aqui do Rio de Janeiro chamamos carinhosamente os Auto-carros (Lisboa), Bus (EUA), buzum (São Paulo) e vai por aí à fora.
Bem, voltando ao fato em questão, minha irmã percebeu que entrou pela porta traseira, onde aqui no Rio de Janeiro, geralmente entram os passageiros, um senhora com um peso notadamente acima do normal, ou seja, uma gordinha dos seus quarenta e poucos anos, até aí nada de anormal.
A senhora colocou-se em posição de pagar a passagem e passar, como normalmente se faz, mas foi interrompida pelo trocador, o que levou ao seguinte diálogo:
- Por favor senhora, entre pela porta da frente.
Ela olhou feio para o trocador, um sujeito magro, cara de cansado, suado, com a barba por fazer, mas com a devida autoridade que o cargo lhe confere.
Ao que respondeu a senhora gordinha:
- Por que? O senhor acha que eu não vou passar na roleta?
Nisso os passageiros que estavam sentados na traseira do coletivo, entre eles, minha irmã, foram atraídos pela cena, que prometia ser interessante.
O pobre do trocador sem querer ser inconveniente, mas sem muito preparo para isso,
tentou consertar, com um certo receio quanto à reação da distinta passageira.
- Não, minha senhora, é que essas roletas são muito estreitas, acho melhor a senhora não tentar, vá pela frente, por favor.
Com a confirmação do trocador, a gordinha não se deu por vencida.
- Ah, quer dizer que o senhor está me chamando de gorda?
Pois vou passar sim e quero ver quem vai me impedir. Toma aqui o dinheiro da passagem, não vou pela frente droga nenhuma!
Bem, a essa altura, os passageiros que prestavam a atenção no impasse, começaram a cochichar e a darem risadinhas. Uns achavam que ela conseguiria, mas a maioria não acreditava nisso, o clima estava ficando mais tenso e além da minha irmã, no meio dos passageiros estava um senhor levemente embriagado, ou seja, um pinguço, com cara de quem iria aprontar.
A gordinha então criou coragem, fez cara de desprezo para a torcida e mais ainda para o trocador e se jogou para frente, num golpe firme e decidido.
Mas o resultado foi crítico e previsível, ela engasgou-se na roleta, ficou uma parte da barriga mais a frente, outra parte presa, juntamente com a protuberante bunda, se é que me permitem ser mais popular.
Todos torciam para ela se desenrascar, mas cada vez que ela empurrava a barriga pra frente ia ficando mais vermelha, de raiva e também pela força descomunal que devia estar fazendo sobre a pobre roleta.
E para piorar a situação da nossa gordinha, ela não pôde segurar e o pior aconteceu:
Ela soltou um pum bem alto, resultado do nervoso e da força feita pela pobre mulher.
Mas o pum não foi em vão, ela conseguiu passar pela roleta de uma vez só.
Ufa, o pessoal meio que constrangidos com a cena viraram a cara, para rirem baixinho, afinal a pobre senhora havia vencido uma batalha pessoal, apesar do famigerado pum que ela soltou.
Mas não era mesmo seu dia de sorte. O passageiro ligeiramente alcoolizado não teve a mesma atitude dos demais e depois de uma gargalhada bem alto ele disse:
- Liga não minha senhora, todos aqui também peidam, eu peido, o motorista peida, até o trocador peida!
A gordinha estava saindo de fininho para não olhar para a cara de ninguém após aquela vergonha toda, teve toda a atenção dos passageiros voltadas para ela, até os que nem estavam acompanhando sua saga na roleta.
Minha irmã, que ri até em velórios, estava se contendo, mas não pôde segurar a risada, após ouvir o que o bêbado falava. Além dela é claro, todos riram muito.
A senhora totalmente vermelha de vergonha e de raiva foi caminhando devagar, pedindo licença e puxou a campainha para descer.
O bêbado continuou falando umas bobagens ao trocador.
Todos voltaram a atenção para suas vidas e a viagem prosseguiu calma, como sempre, no trajeto Centro da cidade até a Penha.
Obrigado à minha irmã Vera por ter me contado essa aventura urbana.