Os médicos monstros: relatos recentes da saúde no Brasil
Por Herick Limoni*
O título desta crônica faz alusão à obra “o médico e o monstro”, do autor escocês Robert Louis Stevenson, cujo título original é Strange Case Of Dr. Jekyll and Mr. Hyde. Na obra ficcional, o médico, Dr. Jekyll, pessoa benevolente e de boa índole cria, através de experiências científicas Mr. Hyde, um pavoroso ser capaz das mais diversas atrocidades e que, no final das contas, acaba por dominar o médico. Trata-se de enredo sobre o fenômeno das múltiplas personalidades.
Nesta semana, dois noticiários envolvendo integrantes do sistema de saúde brasileiro chamaram minha atenção e me fizeram lembrar da citada obra: o caso da médica de Curitiba, capital do Paraná e do quarteto de médicos de Poços de Caldas, sul de Minas Gerais.
No primeiro caso, a médica foi indiciada por homicídio qualificado, acusada de “abreviar” o sofrimento de pacientes que estavam sob sua responsabilidade e, segundo as investigações, tais fatos ocorriam desde 2006, quando ela assumiu a chefia da UTI de uma unidade hospitalar. Ainda segundo as denúncias, a médica simplesmente desligava os aparelhos de pacientes oriundos do Sistema Único de Saúde (SUS), para dar lugar a pacientes da rede particular.
No segundo caso, quatro médicos – ou poderíamos chamar de quadrilha – foram condenados por envolvimento em um esquema de compra e venda de órgãos humanos. O caso veio à tona em abril de 2000, após a morte de um menino de 10 anos, que foi irregularmente diagnosticado com morte encefálica, haja vista que, tempos depois, em inquérito conduzido pela Polícia Federal, comprovou-se que o menino estava sob efeito de substâncias depressivas do sistema nervoso central, substâncias criminalmente utilizadas para atestar sua condição, à época. Apesar de acusados por homicídio doloso, cuja pena prevista é de 12 a 30 anos de prisão, as penas impostas variam entre oito a onze anos e seis meses de prisão, sendo que outros dois envolvidos, por terem mais de 70 anos, tiveram suas penas extintas. Essa postura da justiça merece uma profunda reflexão de todos nós, mas isso é uma outra questão.
Como se já não bastassem as imensas filas nos hospitais e postos de saúde espalhados Brasil afora, as péssimas condições de atendimento, a falta de leitos, as ambulâncias compradas com dinheiro público apodrecendo e sendo depenadas em galpões, as inúmeras denúncias de corrupção etc, aqueles que, com muito esforço e demora conseguem uma internação tem, agora, mais uma preocupação: saber se estão sob os cuidados do médico ou do monstro. É a vida imitando a arte! Nisso tudo, só há uma certeza: Hipócrates deve estar se revirando no túmulo!
* Bacharel e Mestre em Administração de Empresas