O Louco e o Pé-de-Cana
Dizem que a cana é a salvação da lavoura. Tanto a nossa quanto a dos empertigados filhos nobres das terras do Tio Sam. Plantar cana talvez vire febre nacional – seremos o país da Copa, do Samba e dos pés-de-cana – em todos os sentidos.
Já vejo lá a tia Jurema a cultivar sua caninha na sacada de sua janela, em luxuoso condomínio de Copacabana – a princesinha do mar. E imagine cada pedaço da nação com a sua caninha sustentando o fôlego do mundo e a gana por combustível. Quem se lembrará do arroz, do feijão e do milho? Vai ver que é por isso que o café anda tão caro, ou talvez seja por que a China descobriu o que já sabíamos. Cada xícara que um chinês passa a beber sobe em um centavo o custo da nossa bicada.
Falando em China, descobriram a propriedade privada que passa a ter proteção. Chinês ganhando dinheiro é coisa que ninguém esperava ver tão cedo e já figuram em listas da Forbes de bilionários. Quando teremos a lista dos trilhões? O capitalismo suporta tanto?
Desaparece o ciclo negro do petróleo, como um lento ocaso solar. Foi uma fase na qual o sangue jorrou em colunas, como as que brotam do seio das areias secas do deserto; um período de efervescência tecnológica, de guerras frias que congelaram a alma do homem, que fizeram brotar uma cisma entre ocidente e oriente.
Neste meio tempo, surge agora o branco ouro do etanol. Reforça-se a esperança tupiniquim de dias melhores – parece que já vi esse filme. Desde criança me dizem que o Brasil será o país do futuro. A impressão que deixa é de que o futuro passa ao largo, veloz e ligeiro, como as bandas da internet e nos deixa aqui, em passo de espera, ladeando Evos e Hugos, todos com seus males.
Leio nos jornais virtuais, que há muito deixei de lado os de papel, tenho uma implicante alergia a tintas, e o pó me coça o nariz, acabo espirrando e tossindo após ter meus olhos inchados. Deixo de lado minhas mazelas e volto ao que li: Fidel será candidato nas próximas eleições cubanas – aquelas com 100% de aprovação. Imagine-se: 100%. Se toda unanimidade é burra, a cubana é colossal. Só me lembro de algo assim na era Saddam, com as urnas abertas e o voto metralhadora desmerecendo a democracia.
Não, eu não sou um radical de direita, mas tem coisas na esquerda que não suporto: e se o cara quiser ser um capitalista, vender a alma e ganhar dinheiro, nós vamos matá-lo por pensar assim? Sou a favor de que se pense livre, se vote livre, se imprima livremente o que se pensa e que o bom-senso seja a justiça suprema. Sou mais radical de esquerda que os radicais, não aqueles que invadem propriedades, quebram laboratórios, invadem o Congresso e rasgam a Constituição.
Sou um radical que respeita o próximo, que defende a liberdade de crença, que apóia uma educação integral para todos e uma verdadeira e justa distribuição de renda. Renda mesmo e não programas sociais que transformam a população carente em mendigos cadastrados com cartões de plástico.
Espero viver em um país mais justo, com gente mais humana.
Voltando à cana: ao fim da era negra, vem a era branca, e espero com ela uma fase mais civilizada, com energias limpas, renováveis e que respeitem os limites do planeta; que já dá mostras de desgaste, derretendo nas pontas e esquentando-se ao centro. Subam-se as águas e nademos 40 anos nas praias novas que surgirão. Guarujá vai ficar mais perto - quem sabe eu nade em “Berlândia” ou “Beraba”?
Por isso escrevo como um louco, como se não houvesse amanhã, pois se aproxima o fim-de-semana e só quero saber de oba-oba, alegria e churrasco. Por acaso, alguém se lembra do João Hélio?