Não escrevo poesias

Muito poucas vezes arroguei-me postar poesias.

Justifico-me. Sinto minha pequenez diante de poetas que conheço e admiro, e não tenho a ousadia de como eles criar. São maiores, não estão ao meu alcance, gigantes que o tempo consagrou, os professores louvam embevecidos, a crítica aplaude — ainda que nem toda concorde com os poetas e poemas, mas teme ser apedrejada caso discorde.

Longe de mim julgar os corajosos literatos que não permitem ficar estacionada a poesia, repetindo os antigos mestres. São corajosos! Como não possuo tal desprendimento, admiro os poetas que não deixam fenecer a arte dos versos.

A grandeza de tantos famosos amedronta o cronista, que dá como exemplo o seu poema favorito, uma redondilha maior onde Castro Alves mostrou todo o esplendor do canto.

"O Livro e a América

Ao Grêmio Literário

Talhado para as grandezas,

P'ra crescer, criar, subir,

O Novo Mundo nos músculos

Sente a seiva do porvir.

— Estatuário de colossos —

Cansado doutros esboços

Disse um dia Jeová:

"Vai, Colombo, abre a cortina

"Da minha eterna oficina...

"Tira a América de lá".

Molhado inda do dilúvio,

Qual Tritão descomunal,

O continente desperta

No concerto universal.

Dos oceanos em tropa

Um — traz-lhe as artes da Europa,

outro — as bagas de Ceilão...

E os Andes petrificados,

Como braços levantados,

Lhe apontam para a amplidão.

(...)

Por uma fatalidade

Dessas que descem de além,

O sec'lo, que viu Colombo,

Viu Gutenberg também.

Quando no tosco estaleiro

Da Alemanha o velho obreiro

A ave da imprensa gerou...

O Genovês salta os mares...

Busca um ninho entre os palmares

E a pátria da imprensa achou...

Por isso na impaciência

Desta sede de saber,

Como as aves do deserto —

As almas buscam beber...

Oh! Bendito o que semeia

Livros... livros à mão cheia...

E manda o povo pensar!

O livro caindo n'alma

É germe — que faz a palma,

É chuva — que faz o mar.

Vós, que o templo das idéias

Largo — abris às multidões,

P'ra o batismo luminoso

Das grandes revoluções,

Agora que o trem de ferro

Acorda o tigre no cerro

E espanta os caboclos nus,

Fazei desse "rei dos ventos"

— Ginete dos pensamentos,

— Arauto da grande luz!...

Bravo! a quem salva o futuro

Fecundando a multidão!...

Num poema amortalhada

Nunca morre uma nação.

Como Goethe moribundo

Brada "Luz!" o Novo Mundo

num brado de Briaréu...

Luz! pois, no vale e na serra...

Que, se a luz rola na terra,

Deus colhe gênios no céu!..."

Jorge Cortás Sader Filho
Enviado por Jorge Cortás Sader Filho em 18/02/2013
Reeditado em 18/02/2013
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