ZÉ PEREIRA, QUEM FOI ESSE CABA?
POR CARLOS SENA
Eu sei que hoje é sábado de Zé Pereira. Sei que amanhã é Domingo e que nesse dia os frevos de bloco invadem Olinda e o Recife Antigo; eu sei que na segunda e na terça todos os demônios se soltam pelas ruas também do Recife, de Olinda, de Bezerros de Vitória de Santo Antão, de Pesqueira. Juntar-se-ão aos demônios o homem da Meia Noite, a Mulher do Dia, a Mulher da Sombrinha, os Papangus de Bezerros, os Maracatus
de Nazaré da Mata e os Caras de Pau. Mas, nesse "eu sei que" há ainda o que eu não sei, mas confesso já tentei saber: "quem porra foi esse tal de Zé Pereira" que dá nome aos nossos sábados de carnaval? Eu sei que a quarta-feira de cinzar é por conta da igreja nos lembrando que "somos cinzas" e pra ela retornaremos. Nem precisava lembrar desse óbvio, mas tudo bem. Eu sei que a Mulher de Sombrinha é uma lenda de uma mulher que meia noite sai do Cemitério de uma cidade do nosso interior que não lembro o nome dela agora. Eu sei tudo, ou quase tudo do meu carnaval, mas, juro, esse tal de Zé Pereira eu não sei quem foi ou se foi. Terá ele parentesco com o zé Pilintra? Ou com Zé Bia, lá em Bom Conselho de Papacaça? Deixo pra la. Melhor dizer do carnaval - da carne e seu aval. Aval da liberação total, da franga solta a esmo, ou não. Gosto muito desse "ou não" imortalizado por Caetano. Ele cai bem no carnaval, porque reflete o cotidiano, por exemplo, daqueles que passam o ano todo sendo os outros para serem eles mesmos no carnaval... Ou não. Tem os que passam o ano todo dando o "fiofó" e, no carnaval, vão desfilar no SEGURUCU - contradição? Talvez, mas tudo pode ser, inclusive nada no carnaval. Há os que pensam que se enganam e que os outros nem lhes reconhece nas suas putarias. Vão pra rua da dedada nos Quatro Cantos de Olinda e lá se esbaldam. Há os gestores pudicos e não pudicos. Adoram se juntar no LILI. Afinal, nem sempre LILI toca flauta. Há os da bagaceira (adoro) - aqueles para quem qualquer troça não serve, mas I LOVE CAFUÇU é tudo e nada ao mesmo tempo. Muitos vão lá só confirmar o passaporte, porque já vivem uma vida meio cafuçu durante o ano todo. Dos Blocos o DAS FLORES é o meu preferido. Lirismo por lá abunda. Gosto do que abunda, principalmente no Carnaval - meus cais ficam todos expostos aos avais de todos sem preconceito ou com todos juntos no mesmo balaio de gatos. Afinal, "Eu mato, quem roubou minha cueca pra fazer pano de prato"... Ato neste carnaval o frevo abortado pela intolerância do preconceito e meto o pau naqueles para quem o pau agrada, mas debaixo dos panos, como certos padres pedófilos e pastores tipo Málacraia que vivem disseminando a violência a esmo. A esmo só mesmo o frevo em bloco ou um feijãozinho com torresmo. Se pensam que me esqueci do galo, não me esqueci. O galo da Mãe do Guarda, porque da madrugada ele nunca teve nada. Por isso que o carnaval é festa do capeta - pois subverte a ordem natural estabelecida para se inverter. Capeta lúdico, nunca religioso, porque os capetas que essas igrejas pregam estão dentro delas cutucando os lascados para tirar dinheiro contando histórias de bicho papão. O galo não. Se um dia foi frango não sei. Mas se foi que bom que foi, pois não se chega a galo sem frango ser. Hoje ele toma conta do Recife inteiro. Briga pra permanecer no roll do maior bloco do mundo. Que bobagem! O maior do mundo é o da felicidade, do beijo na boca, do ser feliz sem olhar a quem. Assim mesmo, pois no carnaval o vernáculo escorrega e tropeça ao som do frevo rasgado.
Estou na Bastilha, digo Braguilha, digo Brasilia. Tentei tirar o Recife de dentro de mim, mas ele não sai nem com a bobônica do rato, nem com a febe tife. Rendo-me às evidências do Zé Pereira, embora sem saber, de fato, quem foi esse caba. Daqui, da bastilha desvairada cheia de ratos, eu sem piscina, canto frevos de bloco imaginários e mesmo assim sou feliz neste carnaval. Descobri o óbvio na canção de Aldemar: "Quem tem saudade não está sozinho, tem o carinho da recordação. Por isso quando estou mais isolado, fico bem acompanhado como você (Recife) no coração"... Mas, quando ao Ze Pereira, já estou pensando que ele é primo legítimo de Pilatos. Deveria estar no credo, mas está, no credo do CARNAVAL de Pernambuco como pau pereira que dobra mas não quebra. Fui. Vou para o Eixo Monumental ver o Galinho da Madrugada - uma réplica sem futuro do nosso galo aqui em Braguilha.