CARNAVAL DO SEVERINO, uma história de sabedoria e simplicidade.

Encontrei Severino , faxineiro do nosso prédio ontem pela manhã, véspera do feriadão do carnaval ,esfregando o chão de mármore do nosso hall de entrada

Bom dia doutor?

Mostrava um sorriso de muitos dentes brancos que se destacavam naquele rosto mulato escuro e tímido no dia a dia. Percebi uma euforia fora do comum e não consegui me conter perguntando ao mirrado subserviente a razão de tanta felicidade.Disse-me altivo que estava de malas prontas ,passaria o carnaval em sua pequena cidade natal no interior de Pernambuco ,iria de avião com esposa, filhos e a sogra,pois conseguira as passagens promocionais que o filho mais velho pesquisara na internet .Descobri que morava em uma casinha simples na periferia da zona sul de São Paulo construída em mutirão com os irmãos e acabara de adquirir um veiculo gol semi novo. Aquele sucesso me intrigou a ponto de dar continuidade a aquele papo corriqueiro:

E você, não pensa em voltar pro interior?

Pensar, sempre agente pensa Doutor, mas é que passamos tantas necessidades por lá trabalhando até de graça pros fazendeiros que sei lá , minha esposa que foi criada por uma família rica e teve que lavar, limpar e passar a vida inteira e nem na escola eles a colocaram? Ficamos traumatizados Doutor e por aqui estamos vivendo bem melhor ,pelo menos nesses últimos anos, todo mundo esta mais feliz ,se divertindo,fazendo churrasco no final de semana, podendo visitar os parentes no interior e muita gente esta comprando uma casinha e um carrinho, parece que nosso trabalho esta valendo mais. Eu e a Marinalda minha esposa que é babá, trabalhamos com carteira assinada e meus filhos o Maicou e a Jucinéia já estão se preparando pro vestibular entraram no programa de cotas raciais e estamos torcendo, só assim eles vão ter uma vida melhor que a que agente teve, né?

_Severino desculpe a indiscrição mas você é eleitor?

Neste momento Severino recolheu seu sorriso , disse que votava aqui em São Paulo ,mas não continuou a conversa voltando aos seus afazeres diário. Percebendo o incomodo em razão de minha pergunta ,exclamei:

_Poxa acho que nos últimos anos tivemos mesmo uma transformação neste país, nunca havia visto um faxineiro ter casa carro e filhos fazendo vestibular e ainda indo passar as férias no nordeste de avião.

Novamente o sorriso surgiu no rosto do Severino que concordou comigo adquirindo a altivez de antes ,revelou que havia ficado apreensivo quando lhe fiz a pergunta sobre política, pois sempre ouve dos patrões e pessoas de classe alta que o governo é ladrão e que esta acabando com o Brasil,mas com patrão não se discute e cada um pensa o que quer o que vale mesmo é a hora do voto e este é secreto, não é?

Perguntei se este era o mesmo pensamento dos seus conhecidos e me disse que sim, era o sentimento de toda a comunidade pois sentiam com a melhora de vida quem os havia ajudado realmente . Perguntei-lhe por fim sobre a corrupção do governo e se isso não o incomodava, disse-me que sim que acreditava que os maiores ladrões eram os políticos e completou sabiamente: se roubam hoje e conseguem dar bolsa família a tanta gente pobre imagina o quanto não roubavam antes Doutor? Não tínhamos nenhuma chance a não ser trabalhar pra comprar salsicha como mistura ,não davam trabalho nem ajuda e o povo que passava fome.

Desejei-lhe boa viajem e segui atrasado ao meu trabalho, pleno da sabedoria simples de um homem de respeito e cheio de dignidade, mesmo que seu trabalho seja o de lavar as latrinas dos ditos homens de classe alta.

Obrigado Severino e todo o meu querido povo Brasileiro.

Jeff Hernandez
Enviado por Jeff Hernandez em 08/02/2013
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