UM JACARANDÁ NO MEIO DO CAMINHO
Durante anos sonhei em ter uma pista de areia para trabalhar meus cavalos ,porém meu terreno pequeno e com grande declive nunca facilitou tal intento ,certa feita criei coragem e junto ao meu fiel escudeiro consegui criar após metros e metros de terra removida um pequeno platô e por final acabei me conformando com um bom redondel.Fiquei satisfeito,pois finalmente teria um espaço para minhas lições de adestramento colhidas nos livros, com os amigos e dos youtubes da vida,porém um pequeno detalhe deveria ainda ser resolvido:Um jacarandá mimoso que eu mesmo plantara a alguns anos e crescia frondoso exatamente num dos quadrantes do meu picadeiro. Refleti muito e numa batalha épica com meu lado eco, decidi enfim pelo sacrifício da querida árvore.Prestes a dar a ordem ao meu funcionário e carrasco nas horas necessárias percebi que um casal de João de barro havia eleito exatamente a árvore condenada para construir sua genial obra arquitetônica, me obrigando a adiar meu maléfico intento. Numa estranha mistura de frustração e alegria recomendei ao nosso caseiro que revogasse o prazo do fatídico massacre para quando os filhotes já estivessem criados.Passados alguns dias da saída dos filhotes ,uma nova surpresa: Um casal de periquitos sem teto invadiu a linda casinha de barro constituindo um novo ninho de amor e ainda que a reciclagem seja uma atitude atual e necessária não posso deixar de dizer que não fiquei frustrado por ter que adiar meus tão duvidosos planos novamente. Passaram-se dias e pronto a árvore não tinha mais inquilinos e após uma derradeira florada de flores rochas em forma de trumpetes chegava a hora do sacrifício final . Pedi mais uma vez ao caseiro que realizasse a sentença que deveria ser executada no final de semana quando eu não estaria presente. Fechei meu coração e tentei desviar meus pensamentos , foi quando então uma nova surpresa mudou nossos planos , outro casal de João de barro construiu uma segunda casa num galho superior e eu completamente contrariado não tive outra saída a não ser ir levando meus treinamentos com o Jacarandá no meio do caminho. Começamos nossos treinamentos independente do estorvo que mais uma vez florescia exuberante como que implorando por sua redenção. E assim sob sua magnífica e disputada sombra nosso conjunto evoluía ao primeiro passo espanhol e um piaff pouco alçado conseguido após muita insistência e cenouras crocantes . Pensei em desistir do meu intento perverso ,pois aprendi a usar aquele obstáculo a meu favor, me beneficiando da sua sombra protetora nos dias de sol escaldante ,inclusive pendurei um tratador de aves num dos seus galhos onde diversas espécies coloriam minhas manhas hípicas, além do mais novo visitante, um ágil esquilo que engorda a olhos nus. Ontem ao final do meu treinamento quando aproveito para fazer alguns exercícios de alongamento sobre o cavalo ao olhar para os galhos mais altos do Jacarandá constatei perplexo que um novo casal de pássaros iniciava as obras de uma terceira residência naquela árvore que mais parecia um canteiro de obras de um condomínio ornitológico.Foi quando tive certeza que o nosso Jacarandá não mais deveria ser cortado e sim adubado e protegido para o bem de todos os seres que por ele passam e percebem sua inestimável força de beleza e vida.