Retalhos da década de 60

No inicio daquele dezembro da já distante década de 60 o sol de verão era luz, brilho e calor intensos. Com a alma e coração apertados, dou de mão do " Fusca 65" e resoluta, invado a Av. Epitácio Pessoa, deixando para trás outros,que coloriam nossas ruas.Ao passar em frente ao Primeiro Grupamento de Engenharia, engato uma "terceira" e, logo abaixo, quebro a direita.Vejo-me, no portão da tua casa, entre feliz,ansiosa e apressada.De mãos frias e, antes que seja eu, uma quase, desistente, uma porta, se abre a minha frente.

Um sinal de discreta alegria, em teu olhar brincava com a ansiedade que me saltava aos olhos.E, no encanto daquele tímido olhar, uma ponta de ternura sinto no afável "boa-tarde". Nos teus olhos castanhos brilhantes, o mesmo brilho, nos meus havia. E se duvidas tivesse, não as teria mais: nosso olhar, tem o brilho dos apaixonados.

Sobre a mesa, entre livros e papeis, uma máquina " Letrera" portátil da Olivetti, por ti usada. A folha de papel oficio e linhas escritas, esperava. Na janela, um canário "belga, em uma bela gaiola, canta... e, em nós, a emoção, a flor da pele. Eu ali, estática, parada a justificar minha ida a tua casa sem prévio aviso:... "é que, preciso, do primeiro volume de Direito Penal, de Hungria e vim, pegar por empréstimo". Bem próximo, uma porta, dava acesso ao Gabinete-escritório.Do lado esquerdo, na parede, uma estante e uma pequena escada, serviu, para me servir.

Agora, catalogando lembranças, vejo a nudez dos teus pés exposta, em cada degrau daquela escada e, solidariamente aos teus pés, uma calça Jens, desbotada, também, entregue a mesma tarefa. Nas tuas mãos o Volume I, Tomo II, Comentários ao Código Penal, Arts.11 a 27 Editora Forense, com suas 475 páginas, contigo, também descia.E, quando teus pés, prestes a tocar o chão, minha mão te ofereci...

Naquele instante mágico do toque da nossas mãos, ali ao pé daquela escada, portátil, em aluminio, fabricada, trocamos o primeiro dos nossos abraços. E, pela vida afora, alguns outros braços, me enlaçaram, mas, daquele abraço, nunca esqueci. A vida,entre nós em paralelas andava e, por todos estes anos, por incrível que pareça, de vez em quando, me vem a lembrança, o encanto do teu olhar... e a ternura daquele abraço.... não, esqueci!

Josenete Dantas
Enviado por Josenete Dantas em 08/02/2013
Reeditado em 18/06/2017
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