Quadro
Quando ela tinha dez anos, uma casa modesta começou a contornar suas histórias e bonecas. Com aparência borrada, a arquitetura consistia em um cômodo vazio, iluminação natural e uma ligeira brisa que preenchia o chão batido e chegava às suas pequenas narinas como um atrapalhado fio sem procedência, desses que invadem o semblante da vida faltosa de licença.
Apesar de estranha, a menina habituou-se à incongruência de suas paredes e, sem ambição, construiu uma genealogia completa, em que bonecas nasciam e morriam sobre a modesta telha de revestimento desconhecido.
Os anos se passaram.
Diante do espelho, ela pouco via, em meio às lágrimas. Agora, a casa era grande, com refrescantes janelas de seda. O cheiro lembrava circunferências, diâmetros perfeitos que sua mãe fazia ao bater a massa, misturando os pontos e o aconchego.
A cada notação do tempo, ela completava a casa. Um fogão vermelho e um jogo de panelas com o cabo da mesma cor eram o seu maior orgulho, mesmo pouco ou nada sabendo de cozinha. Na verdade, a nova moradia parecia tão possível que a confundia, começando pelas escadas, longas e espaçadas como se alguém pudesse morar nelas.
Ela tinha conseguido tudo, mas a incongruência havia permanecido. Ela contornava cada pequena fresta de vida que surgia nos esplendorosos raios de sol e, ao passo dos anos, a linha estava cada vez mais marcante, como se alguém houvesse sido contratado para, com sofreguidão, destacar violentamente o que estava escondido.
Sem freios, ela atravessou a vida de forma maquinal. Alimentou cada cômodo luxuoso com uma lasciva urgência, uma certeza de que, ao final, respiraria a vida em sua forma real. Cegou-se para tudo e alargou propriedades, lustrou escadas maiores e, sem ocupar-se com reflexões, consumiu as horas, minutos e segundos com a missão obstinada de nunca mais tracejar remendos no assoalho ou nos abraços.
Um dia, desembaraçando seus cabelos, já brancos, ela se olhou novamente no espelho e notou, com dificuldade, que todo aquele cenário havia desaparecido. Arregalou os olhos e, chorosa, ela soube. Perdida em pensamentos trêmulos, cerrou a vista e chorou ao sentir que chegara ali, ao vazio das construções.
Deitou-se em sua verdadeira cama, recordou com detalhes os primeiros arranjos natalinos feitos cuidadosamente com restos de costura, do entardecer rabiscado a qualquer hora e, como se chegasse à última gota de solidão, e constatando a dureza da vida, adormeceu sob a saudade de ter sido, longe dali, apenas uma boneca.