O Dia Em Que O Mar Quase Me Engoliu.

Há uns tempos atrás,toda 6a.feira,às 18 horas,tomava um ônibus fretado e descia a Serra para S.Vicente.Acredito que exista um Karma mal resolvido entre mim e S.Vicente.Acredito que eu vim com a tropa de Martim Afonso,lá pelos anos de 1540. É sério! Tantos fatos aconteceram comigo nesta cidade que acredito piamente no que afirmei.Deixemos os outros e vamos relatar apenas um deles.S.Vicente era um lugar pacato,ideal para aposentados,ideal para tranquilidade junto ao mar e a brisa ozônica.Hoje a vida está um pouco salgada devido ao Pré-Sal,já que um amigo,que mora em Santos,me contou sobre a transformação.O Sal e a Água fazem bem ao corpo e à Alma.nosso corpo é composto de 80% de água e 20% de sais. Então...Todo sábado de manhâ ia caminhar uns bons kms.na Praia de Itararé,da Ilha Porchat até a divisa com Santos,no José Menino.Bela caminhada,bela vista,bela sensação de sentir-se pleno de saúde.Quantas vezes,após ressaca no mar,encontrei a água limpinha cheia de arraias,é arraias! ,siris,vôngoles,mexilhões às pencas,tudo trazido pela maré forte da ressaca.Colhia os mexilhões e vôngoles, me deliciava em prepará-los e deixá-los em vinagrete para a semana seguinte. Delícias poucas que um mar poluído,às vezes,oferece,logo,aproveita-se.A volta pela praia era puxada para forçar os músculos da perna e respiração.Ia até junto à Ilha Porchat onde,todo sábado,encontrava um pescador e seu barco a vender sua mercadoria.Era muita gente a atormentá-lo.Como era simples,ficava atarantado com o pessoal de fim-de-semana.Eu o ajudava na venda de camarões e peixes.Não lembro mais o nome dele.Moreno,forte,simples e simpático.Depois da caminhada ia prá casa preparar a matula e a *Amada Amante*para ir à praia.Ficava numa pequena praia entre a Ilha e a praia da Biquinha *Praia dos Milionários*!!!Só no nome.Era gostoso ficar sentado olhando para a Baía de S.Vicente e o Morro do Forte e,em junho/julho,ver as taínhas subirem desde o mar para o mangue para desova.Algumas enormes saltavam em verdadeiras pirotecnias para nosso deleite.O Manguezal fica depois da Ponte Pênsil e adentrava até junto à estrada Imigrantes.Na *Amada Amante* trazia cerveja(óbvio)sanduiche frio,água,abridor copos.Debaixo do guarda-sol ou chuva ficava até lá pelas 7/8 da noite no horário de verão,pois no inverno era mais cedo a retirada.O mar da baía não tem muitas ondas,são marolas pequenas ou no meio da baía,às vezes.alguma onda mais forte.Com ressaca,o mar invadia a avenida beira mar.Era lindo e apavorante o repicar das ondas enormes nos paredões da calçadas.A meninada se divertia para desespero das mães.Fora isso,o mar da baía era para almirante nenhum reclamar.Tranquilo...Eis,senão quando,num domingo de muito sol,me aparece o barqueiro a minha procura na praia.Como é pequena foi fácil.Falou-me em retribuir minha ajuda com os peixes e camarões,com um passeio pelo mangue e ver águias pescadoras.De pronto eu estava.Partimos...Sol a pino,dia lindo,barco pequeno de alumínio,pescador experiente e satisfação em interagir,em retribuir,em compartilhar seu meio de vida.Maravilhoso,não??? Eu estava encantado e fui-me feito criança à procura de um bolo de aniversário.Ostras mil por todo canto,rejeitadas por estarem poluídas por metal pesado.Se parávamos para apreciar a beleza,os borrachudos se deliciavam e como! Chegamos até o pé da Serra.Garças,mergulhões,águia pescadora e outras aves,até mesmo a Guarapiranga(garça pequena vermelha).Uns malucos japoneses estavam a pescar,apesar dos borrachudos,em águas tão poluídas.As ostras que peguei joguei fora pelo perigo da poluição.São vários os canais que cortam o estuário e quem não conhece se perde nos meandros.O passeio durou mais de uma hora.Satisfeito e contente,arrumei-me na ponta do barco para a volta.Mar de almirante,sem ventos fortes,só marolas.Lá fomos nós em busca de uma cerveja gelada.Passamos de volta em baixo da Ponte Pênsil e adentramos a baía.Eu cantando,sentado na frente do barco,sorria para a vida.Ele satisfeito por retribuir uma ajuda.Tudo estava perfeito até que,meio da baía,abriu-se um buracão na água,algo da altura de uns 5 andares.Gritei-*Segura,peão,que vamos morrer!!!* A experiência traz a calma.Outros mares bravios talvez o tivessem ensinado a realizar manobra de surfista.deslizou sobre a crista da onda enorme para a esquerda e se safou do pior.Voltamos para baixo da Ponte Pênsil e ficamos em silêncio por uns minutos.O dia estava muito lindo para morrer,se é que tem dia para morrer.Levou-me de volta para meu pedaço de praia.Agradeci e pouco falamos.Eu estava branco como as poucas nuvens do céu.Sentei-me embaixo do guarda-sol,abri uma cerveja,olhei para o mar e refleti-*Ainda não é a Hora.* Se alguém falou comigo,eu não ouvi,aliás,não ouvi mais nada até tarde.O dia estava muito lindo para uma tragédia.No dia seguinte,quem ficou de ressaca fui eu e não o mar.Como diz Paulinho da Viola numa canção-*O Mar não tem cabelos onde se possa agarrar.*Voltei para SP pensando no acontecido.Até hoje penso. O que aconteceu com o mar naquele dia/tarde?Nem marinheiros experientes com quem conversei me deram uma resposta conclusiva.Acho que vou escrever um conto-*O Dia Em Que O Mar Quase Me Engoliu*.Fiquem na paz!

Chico Chicão
Enviado por Chico Chicão em 01/02/2013
Reeditado em 01/02/2013
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