O VIOLINO (VIVENDO E APRENDENDO)

Estávamos voltando do sítio em Caucaia do Alto, numa tarde calorenta de um domingo, e não sei qual foi o assunto que saiu a palavra “una”. Disse eu então ao David e à Nadir que achava que essa palavra tinha alguma relação com a cor negra, pois vejamos:

Graúna é um pássaro negro;

Paraíbuna também tem relação com a cor negra, a água escura talvez;

Caviúna é uma madeira de cor negra.

-É, disse o David, você sabia que o violino é feito de caviúna?

- Não, respondi.

- Disse também que ganhei um violino?

- Não.

- Disse então o David – É uma história que dá para você escrever. Quer ouvir?

Respondi. – Temos mais ou menos quarenta minutos até chegar à sua casa, se der tempo até lá, pode começar.

Então o David começou.

- Fui até a oficina do Caé e lá estavam dois violinos. – As caixas estavam detonadas, mas os violinos estavam bem conservados, perguntei:

- Você está tocando violino? Nunca soube, pensei que você só sabia mexer no torno.

- Eu comprei esses violinos de um cara por trezentos reais, um deles, dei ao meu filho e o outro, se você quiser, é seu. É presente.

- Presente a gente não recusa, pode deixar que vou dar aquele capricho nele, disse. Levei o violino para casa, deixei-o novo como se saído da fábrica, mas veio sem o arco e violino sem arco não toca, nem Vivaldi faria uma mágica dessas. Vi dentro do violino o numero de fabricação e a fábrica, que fica estabelecida em uma cidade do interior de São Paulo. Eu e o Roberto fizemos uma pesquisa e vimos que o arco mais barato, situava-se em mais ou menos cento e cinqüenta reais nessas lojas de instrumentos musicais usados.

- David, disse o Roberto, quando formos a Furnas a gente passa por lá, já que é caminho, e vamos até essa fábrica, quem sabe lá é bem mais em conta.

Comentei com o meu professor de violão que tão logo eu dominasse as notas do violão eu gostaria de aprender violino, até lá já teria o arco. Uns dois meses depois fomos a Furnas e após muito perguntar, localizamos a fábrica. Para minha surpresa, era uma residência bem modesta com um portão alto do lado que por sinal estava semiaberto. Notei que nos fundos havia uma espécie de oficina. Bati palmas e apareceu um senhor idoso, então perguntei:

- Aqui é fábrica de violinos?

- Sim, eu faço violinos, respondeu aquele senhor.

- Eu ganhei um violino sem o arco que tem este endereço e vim para comprar um arco e pelo jeito estou no lugar certo, depois de muita procura.

- Esse violino tem um defeito da madeira na ponta do braço?

- Não sei, está comigo aí no carro, vou buscá-lo. Aguarde um pouco só.

Quando voltei com o Roberto, o senhor me aguardava com um BO (Boletim de Ocorrência) e eis que o numero de fabricação do “meu” violino lá estava mencionado.

- Quanto o senhor pagou por esse violino?

- Eu ganhei de um amigo que comprou dois por trezentos reais.

- Puxa vida, trezentos reais. Só a madeira eu pago isso.

- Por mim o violino é seu e eu não gastei nada, não quero nada e o senhor vai ter o outro agora. Deixa-me usar seu telefone?

- Caé, você ainda está com o violino do seu filho, aí? Porque eu estou aqui na fábrica, diante de um BO. Esse instrumento foi roubado e você pode ser incriminado como receptador. O violino que era meu, eu já entreguei.

- Pode dizer para o dono dele que eu não quero encrenca e o violino está bem guardado. Como posso fazer para entregar o violino?

Passei o recado e aquele senhor me respondeu.

- Quem vai buscar o violino é o próprio dono que mora em São Paulo, passa-me o endereço e o telefone que eu o comunicarei.

- O violinista para quem eu os produzi vai ficar muito contente em saber que os violinos foram recuperados e tomara que o outro violino esteja tão bem conservado como este.

-Então eu disse para o “luthier”: - O senhor vai comigo à delegacia declarar que lhe estou entregando o violino e quero um BO de devolução e uma cópia desse BO aí.

- Claro, claro e fico até agradecido, pois meu prejuízo foi muito grande. Eu tinha vendido esses violinos por seis mil reais cada um e despachei pelo correio. O carro foi assaltado e lá se foram meus violinos, mas não posso lhe pagar nada, pois o correio me ressarciu apenas duzentos e dez reais e como lhe disse não paga nem a madeira que tem que ser especial.

Contou-me o meu cunhado que o “luthier” mostrou-lhe todo o processo de fabricação, totalmente artesanal e as medidas são milimétricas para dar o equilíbrio correto, tudo feito na lixa e o tempo que se leva para produzir é de quatro meses em média e a maior surpresa veio depois quando perguntou sobre o arco.

- Eu não fabrico arcos, eu apenas compro os fios de rabo de cavalo, dou um banho químico para homogeneizar a cor e envio para o fabricante em São Paulo.

- Quer dizer então que o que dá som do violino é um fio de rabo de cavalo?

- Um não, mas vários fios “colados” e esticados paralelamente.

- E quanto custa um arco?

- Nacional você pagaria uns seiscentos reais, mas os importados chegam a custar até três mil reais.

Recantistas, quantos de nós sabíamos que aquele som maravilhoso, deleitável, do clássico “Primavera” de as Quatro Estações de Vivaldi é produzido por vários fios de rabo de cavalo?

“Vivendo e aprendendo” sábio dito popular

SB/30/01/2.013.

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 30/01/2013
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