Mulheres de coração, mas com o canudo na mão!

Uma publicação oficial do Vaticano noticiou durante “generosa” homenagem ao Dia Internacional da Mulher realizada em 2010, que a Máquina de lavar roupas é o verdadeiro símbolo da emancipação feminina no século XX.

Óbvio que a declaração provocou a fúria de mulheres em todo o mundo, Afinal, depois de se matarem para conquistar o direito ao voto, à inserção no mercado de trabalho, às prerrogativas civis no casamento e, mais recentemente, o direito de criarem uma nova espécie feminina na escala evolutiva – a das mulheres frutas, transgenicamente modificadas em laboratório pela generosa manipulação de todas as variáveis do silicone – ouvir uma declaração dessas chega a ser um sacrilégio.

Exercendo meu pensamento crítico, naturalmente tendencioso e egoísta, confesso que me vi inclinada a concordar com o jornal. Bastou recordar os ensolarados e convidativos domingos que passei me divertindo com uma pilha de roupas e uma barra de Sabão Pavão, tudo após uma exaustiva semana de trabalho.

Mas mesmo sendo uma feminista meio fajuta, não posso me eximir das responsabilidades perante minhas companheiras. Afinal, concordar com isso seria destruir qualquer sonho de liberdade daquelas que ainda não fizeram seu crediário em uma loja qualquer dentro das incríveis condições econômicas oferecidas pelos financiamentos brasileiros, do tipo, compre 1 e pague 3.

Portanto, dentro da minha modesta experiência nesses trinta e poucos anos, tenho o direito de ensaiar alguns pitacos. E acatando a sugestão de um amigo que embora homem e com fator agravante de ser militar, mas que tem lá sua razão, resolvi fazer algumas reflexões sobre a contribuição do ensino universitário nesse processo emancipatório.

A crise dos 30 anos impulsionou-me a voltar a estudar. Isso depois de vagar por 14 anos num limbo intelectual que, se bem aproveitados, teriam me rendido até diploma de PHD. Mas tudo bem, mesmo tardio é gratificante, embora tendo de enfrentar diariamente a leitura da frequência que delata o apêndice de CHICA junto ao meu nome. E quanto ao temor de sentir-me uma vovó em meio à juventude transviada, Deus me presenteou com um colega de classe bem mais velho, cujos cabelos grisalhos distraíam a turma da minha condição etária.

Em pouco tempo pude sentir a expansão do meu outrora limitado universo, e a ansiedade faz sonhar com especializações, doutorados e afins, mal tendo começado o 1º semestre.

Diante de tamanha empolgação, bateu a depressão típica de quem carrega a culpa como item de série. Fiquei me recriminando por ter adiado tanto tempo esse sonho, pois àquela altura da vida havia outros dilemas à administrar, como o impasse entre a maternidade e a carreira que se desenhava.

Muitas mulheres justificam que não realizaram suas metas pela recusa de seus companheiros, ou em nome do bem-estar familiar. Mas pelo menos da minha parte, garanto que esse altruísmo tem uma faceta egoísta. O autoboicote é motivado pela sensação de achar que não merece, mas também por acreditar que outros setores da vida não sobreviveriam sem você.

Conheço mulheres amarguradas que depois de suprimir seus desejos - muitos destes de natureza intelectual - em nome de um casamento, foram sumariamente abandonadas pelos companheiros que não tiveram qualquer dúvida em desfazer a união, quando esta não mais lhe convinha. E as cunhãs, revoltadas, mais uma vez paravam suas vidas dedicando tempo e energia na tarefa de perseguir e acusar o sujeito pelo próprio fracasso, quando na verdade eram elas as culpadas. Afinal, por mais machista e dominador que o companheiro fosse, no final, a decisão é sempre de foro íntimo e só somos vítimas enquanto permitimos que outros se apoderem e controlem nossas vidas.

A evolução intelectual e cultural da mulher é fundamental para a emancipação, pois é nessa base que se constrói uma nova leitura sobre você e sobre o mundo. A convivência com outros tipos de pessoas, o confronto e a harmonia de pensamento, a aquisição de novas ideias, tudo isso num nível bem além de dos mexericos envolvendo a vizinha ou debates sobre o final da novela.

Claro que o Brasil ainda é pobre em oportunidades de acesso à educação e as mulheres sofrem mais com isso. Mas se existe a mínima possibilidade de tentar, mesmo que com certos sacrifícios, então colega, faça! Porque além do benefício próprio você amplia o diâmetro de um círculo que aos poucos vai incorporando mais mulheres de sua convivência, o que numa análise holística confirma sua participação ativa no sucesso global do movimento feminino.

Imitamos comportamentos humanos principalmente dentro do seio familiar, portanto se quer mesmo deixar um bom legado, invista no amadurecimento intelectual que o seu exemplo será, de longe, a melhor herança. Sem esquecer, é claro, da satisfação pessoal. Esse deleite é todo seu e ninguém tasca!

Feminista de Arake
Enviado por Feminista de Arake em 30/01/2013
Reeditado em 30/01/2013
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