Crônica publicada no Jornal “O Norte”, Montes Claros-MG, dia 11 de fevereiro de 2009
E como floresce a Língua Portuguesa e se torna, a cada dia, uma senhora acolhedora de seus falantes. Muitos destes mal-educados, outros, ousados e alguns adotivos, mas todos filhos muito amados por esta mãe que não se importa se o seu rebento segue ou não a gramática. Por isso, amo-te, flor do Lácio!
Podemos imaginar que a língua é uma filha, e a gramática é uma mãe enérgica. Uma analogia delirante, porque primeiro surge a língua e depois a gramática. Mas é sabido que a mãe tende a regular a filha, logo notamos que a gramática tende a regular a língua mesmo que a gramática tenha nascido muito depois. Não é necessária a gramática para se ter uma língua! A gramática é uma frustrada, pois não consegue cumprir o seu papel. Prova disso é o nosso próprio Português. Portugal se torna uma nação no século XII e a primeira gramática portuguesa aparece no século XVI, pelas mãos de Fernão Lopes (1536). Os portugueses falaram e se comunicaram nesse período perfeitamente sem nenhuma norma escrita regulamentadora. Mas, sobretudo com a reforma ortográfica, alguns falantes brasileiros se questionam se falam certo ou errado.
Em praças, muros, na mídia televisiva ou impressa, percebem-se desvios da norma culta. Cartazes e faixas de anúncios como “altomatiza-se portões” (falha ortográfica e sintática) deixam qualquer gramático ou purista da língua indignado. Os decalques, traduções literais de termos estrangeiros, como “cachorro quente” para “hot dog”, são esquecidos, e o anglicanismo é a preferência nacional. No uso da “internet”, preferimos usar “site” a “terreno”, mas conheço alguns que usam “sítio”. O uso do pronome oblíquo no início de frases fere os ouvidos de muitos (me ajudem!), exceto os do Oswaldo em “Pronominais” (deixa disso, camarada, me dá um cigarro). Contudo, ainda que haja um desespero para seguir padrões gramaticais da língua, o foco principal desta é a comunicação, a transmissão da mensagem, não importa se obediente ou não a norma culta.
O discurso ou fala são manifestações individuais da língua. Assim, cada indivíduo fala a sua própria língua, com sua voz singular, com o seu jeito ímpar de dizer. Então, se um garoto diz a uma moça, “vamu nu cinema?” o importante aqui é a garota aceitar ou não o convite. Se a entrega é “a domicílio” e não “em domicílio”, espera-e que a encomenda chegue em casa (ou como deseja Cunha e Cintra, Cegalla, Sacconi e tantos outros “a casa”).
Usar mal a língua não é fugir dos preceitos gramaticais, mas criar incompreensões no discurso, ambiguidades (agora sem trema), usar um discurso inadequado ao contexto. Dessa forma, não é preciso exigir formalidades em uma conversa de boteco (ou seria buteco?). Contudo, em um fórum, ou em uma apresentação de dissertação ou defesa de tese, é bom frear algumas colocações coloquiais. Um professor não dirá a um aluno fundamental que ele cometeu “quiproquós”, mas enganos. Da mesma forma, um advogado erudito não pedirá licença, mas “data vênia”. A situação é que dirá a forma de dizer.
Uma língua bem dita (bendita) é aquela que comove, que ensina e que inspira. Não existe uma região do país que fale melhor ou pior, assim como não existe nenhum ser idêntico ao outro. As variações existem e devem ser respeitadas. Então que se pare com essa idéia de que alguém fala ou escreve errado só por que trocou um “u” por um “l”, ou por que não fez a concordância ou regência exigida pela gramática. O desejo de todo falante português é receber uma cartinha da pessoa amada e ler, não com os olhos faciais, mas com os do coração um bem traçado e verdadeiro: “te amo!”
Te amo
“Floresça, fale, cante, ouça-se e viva
a portuguesa língua, e já onde for,
senhora vá de si, soberba e altiva”
(Antônio Ferreira).
a portuguesa língua, e já onde for,
senhora vá de si, soberba e altiva”
(Antônio Ferreira).
E como floresce a Língua Portuguesa e se torna, a cada dia, uma senhora acolhedora de seus falantes. Muitos destes mal-educados, outros, ousados e alguns adotivos, mas todos filhos muito amados por esta mãe que não se importa se o seu rebento segue ou não a gramática. Por isso, amo-te, flor do Lácio!
Podemos imaginar que a língua é uma filha, e a gramática é uma mãe enérgica. Uma analogia delirante, porque primeiro surge a língua e depois a gramática. Mas é sabido que a mãe tende a regular a filha, logo notamos que a gramática tende a regular a língua mesmo que a gramática tenha nascido muito depois. Não é necessária a gramática para se ter uma língua! A gramática é uma frustrada, pois não consegue cumprir o seu papel. Prova disso é o nosso próprio Português. Portugal se torna uma nação no século XII e a primeira gramática portuguesa aparece no século XVI, pelas mãos de Fernão Lopes (1536). Os portugueses falaram e se comunicaram nesse período perfeitamente sem nenhuma norma escrita regulamentadora. Mas, sobretudo com a reforma ortográfica, alguns falantes brasileiros se questionam se falam certo ou errado.
Em praças, muros, na mídia televisiva ou impressa, percebem-se desvios da norma culta. Cartazes e faixas de anúncios como “altomatiza-se portões” (falha ortográfica e sintática) deixam qualquer gramático ou purista da língua indignado. Os decalques, traduções literais de termos estrangeiros, como “cachorro quente” para “hot dog”, são esquecidos, e o anglicanismo é a preferência nacional. No uso da “internet”, preferimos usar “site” a “terreno”, mas conheço alguns que usam “sítio”. O uso do pronome oblíquo no início de frases fere os ouvidos de muitos (me ajudem!), exceto os do Oswaldo em “Pronominais” (deixa disso, camarada, me dá um cigarro). Contudo, ainda que haja um desespero para seguir padrões gramaticais da língua, o foco principal desta é a comunicação, a transmissão da mensagem, não importa se obediente ou não a norma culta.
O discurso ou fala são manifestações individuais da língua. Assim, cada indivíduo fala a sua própria língua, com sua voz singular, com o seu jeito ímpar de dizer. Então, se um garoto diz a uma moça, “vamu nu cinema?” o importante aqui é a garota aceitar ou não o convite. Se a entrega é “a domicílio” e não “em domicílio”, espera-e que a encomenda chegue em casa (ou como deseja Cunha e Cintra, Cegalla, Sacconi e tantos outros “a casa”).
Usar mal a língua não é fugir dos preceitos gramaticais, mas criar incompreensões no discurso, ambiguidades (agora sem trema), usar um discurso inadequado ao contexto. Dessa forma, não é preciso exigir formalidades em uma conversa de boteco (ou seria buteco?). Contudo, em um fórum, ou em uma apresentação de dissertação ou defesa de tese, é bom frear algumas colocações coloquiais. Um professor não dirá a um aluno fundamental que ele cometeu “quiproquós”, mas enganos. Da mesma forma, um advogado erudito não pedirá licença, mas “data vênia”. A situação é que dirá a forma de dizer.
Uma língua bem dita (bendita) é aquela que comove, que ensina e que inspira. Não existe uma região do país que fale melhor ou pior, assim como não existe nenhum ser idêntico ao outro. As variações existem e devem ser respeitadas. Então que se pare com essa idéia de que alguém fala ou escreve errado só por que trocou um “u” por um “l”, ou por que não fez a concordância ou regência exigida pela gramática. O desejo de todo falante português é receber uma cartinha da pessoa amada e ler, não com os olhos faciais, mas com os do coração um bem traçado e verdadeiro: “te amo!”