No meu paraíso...

Tenho uma “má nova” para transmitir aos crédulos de plantão. Não gostaria de ser portador deste evangelho, negativado pela minha racionalidade e pelo que sinto e vejo. Pessoas estão a construir suas esperanças em bases “quiméricas”, fantasiosas, utópicas...Lutando por uma causa sem causa. Vislumbrando um mundo sem mundo. Ou seja, uma causalidade sem fundamentação exegética, hermenêutica, histórica, antropológica e que no mínimo requererá a morte da vida enquanto vida. “Ganhar o futuro matando o presente” é a síntese deste pensar irracionalizado, desmedido, incrédulo da vida, incapaz de enxergar a realidade que o rodeia. Sofrendo de uma hipertrofia mental, indistintamente percebe-se em um paraíso, só prometido aos que convalescem de “espírito pobre”...Que não argumentam e não dialogam com o cotidiano. Que não se interessam por nada que se refira a problemática da existêncialidade dos seres que estão no aqui, no agora, no presente.

Anseiam por uma morada futurística, aplainada. Adornada com esmeraldas, pincelada de diamantes. Com ruas de ouro, mar de cristal, muros de rubis. Leão vivendo pacificamente com os seres humanos que foram transformados geneticamente em angélicos sobreviventes do mundo carnal e fétido. Lá não haverá guerras, rumores de guerras. Só haverá paz. Não haverá luz elétrica, pois o sol brilhará dia e noite. E mesmo não haverá nem dia e nem noite. Não haverá sistemas, corrupções, tramas, roubos, facção. O capitalismo não será selvagem, pois mesmo os sem capital terão do que se alimentar. Então não haverá a fome, miséria, dor, sofrimento. Exploração do homem pelo homem, ficará tudo no mar do esquecimento dos ideólogos marxista/socialistas. As pirâmides estatais desaparecerão. As sociedades explicativas de Rousseau, Hobbes, Durkeim, Webber , perderão significação. Não haverá continentes, barreiras geopolíticas, geoeconômicas, “georaciais”, será tudo uma coisa só e uma só coisa. Homens, mulheres. Adultos, jovens, crianças, na mais perfeita simetria e sintonia. A cultura será universalizada. A natureza seguirá o seu curso sem causar sinistros e desastres, pois harmonizará a sua grandeza com os novos céus e com a nova terra. A musicalidade será liberta do erotismo vulgarizante e das letras pornográficas em especial aquelas do funk. Um coral estará eternamente a cantar vivas ao classicismo erudito divinal, com regência dos arcanjos e acompanhamento dos serafins.

Bem; o meu mundo, ou melhor, no meu mundo. O real. O “presenciável”. Tangível. Pessoas moram em pau a pique, casebres, barracos. De baixo de pontes, viadutos, marquises, toldos. As favelas já existentes crescem a cada dia e outras estão a surgir nas grandes capitais. As ruas são de barro, esburacadas, mal sinalizadas, estreitas. Paga-se pedágios em algumas delas, e pedágios caros por sinal. Os muros e muretas são sujos, pichados, quebrados, violados. As facções são cada vez mais organizadas e poderosas em suas ofensividades bélicas. Os números dos homicídios crescem a cada instante. A violência já não distingue cidade do campo. Centro da periferia. Asfalto do morro. As famílias desintegram-se. Volumosos são os números dos divorciados. Catástrofes e desastres estão por todo o lado a assustar a população mundial. A natureza evidencia o que já sabemos: estamos destruindo o planeta. Maximiza-se, em nome do progresso, as matanças e desmatamento da fauna e da flora. Acirram-se o capitalismo na sua pior demonstração maléfica: as desigualdades. Fome e miséria arrastam milhares para os túmulos. Vivemos em um clima de guerra. As ameaças são uma constante entre as nações. A diplomacia está ameaçada de perder o jogo para o enfrentamento logístico e sangrento de um conflito. Novas doenças estão sendo descobertas e as que já se pensava erradicadas voltam com mutações perigosíssimas aos seres humanos. No meu mundo as crianças são exploradas, violentadas e mortas. “Di menor” mata, rouba, seqüestra. Os velhos e aposentados são esquecidos e jogados no ostracismo dos asilos. As mulheres sofrem ameaças e são agredidas covardemente todos os dias. Muitas delas se prostituem para alimentar seus filhos. Os direitos não são respeitados. “não há justiça entre os desiguais”. A raciologia determina quem é mais apto e mais inteligente. Os preconceitos existem e demarcam fronteiras. A educação não é levada a sério. Faz parte de um discurso politicamente correto, mas a aplicabilidade não acontece. No meu mundo pessoas morrem nas filas esperando atendimento nos hospitais. Verbas são desviadas para saciar a sede de inescrupulosos e de seus familiares. A ordem foi questionada e estabeleceu-se um clima de tensão no ar. Velhos conceitos foram substituídos por uma nova ideologia que permite a relativização das verdades antes tidas como insofismáveis e inquestionáveis. A religião não mais oferece alívio e respostas diante destas mudanças e ânsias do ser “pós moderno”. A ciência que vendeu-nos a ideia de que teria a resposta para tudo e todos, viu que não tinha todo esta onipotência e magnitude.

No meu mundo...

Não vivo a expectativa de um céu colorido. Vivo e presencio a luta diária pela sobrevivência.

Pense Professor Moises

filoliveira
Enviado por filoliveira em 28/01/2013
Reeditado em 02/04/2020
Código do texto: T4109641
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.