SÃO PAULO NO PÚLPITO DA MÍDIA

Ontem, vinte e cinco de Janeiro de dois mil e treze, a cidade de São Paulo comemorou quatrocentos e cinquenta e nove anos de idade, uma cidade que, embora sofrida, ainda é muito jovem se comparada às principais megalópoles do velho mundo.

Como já nos é de costume comemoramos em grande estilo, um evento sócio-político -cultural com festas espalhadas por todas as regiões da cidade com a participação de brasileiros aqui residentes bem como visitantes vindos de todas as regiões do Brasil...e do mundo.

Na qualidade de paulistana eu também comemorei e, apaixonada que sou pela cidade e por fotografia, então resolvi fazer uma homenagem diferente, reencontrar pontos da cidade cujas lembranças eu carrego comigo desde criança para "clicá-los" e postá-los na rede, vícios da modernidade bem distante da cidade que conheci quando criança.

Já fazia muitos anos que eu não me deparava tão intimamente com aquela cidade de outrora, agora existente só nas minhas lembranças, posto que eu rapidamente a percebi muito mudada no momento em que precisei enxergá-la melhor para fotografá-la.

A arte sempre se espelha melhor nas duras realidades da vida.

E quantas realidades duras ,todas juntas, eu as pude enxergar por ali.

Assim, escolhi o marco zero da cidade, exatamente a praça que sedia em grande estilo a nossa belíssima Catedral Metropolitana da Sé, uma bela construção arquitetônica de estilo Neogótico, embora ali exista elementos que também a caracterizam como uma obra de arquitetura eclética.

Assim que ali cheguei já começava a tradicional missa de aniversário da cidade em que várias famosidades do mundo político sempre marcam sua presença.

O entorno da Catedral prontamente me foi extremamente significativo do ponto de vista filosófico e humanitário, algo meio incongruente, posto que subindo as escadarias, por entre o trajeto das elegantes palmeiras imperiais, à minha esquerda uma faixa de isolamento protegia os oficiais carros de luxo, aquela imensa frota de seminovos que por pouco não foi toda trocada pelos nossos exigentes representantes públicos; à minha direita via-se os carros das principais mídias televisivas e da imprensa jornalística, todos brigando pelo espaço da notícia e que lá dentro filmavam a celebração religiosa com suas parafernálias de vídeos e câmeras ancoradas até nos púlpitos principais da catedral.

Todavia o mais intrigante: no demais entorno da Igreja, um exército de moradores de ruas e muitos drogaditos, todos amontoados humanos ao leo da praça, se ajeitavam para despertar frente ao dia de festa que já acontecia. Um grupo dos manifestantes sem voz gritava por suas necessidades mais urgentes. Uma faixa dos "sem -terra" se erguia muda logo adiante, alguém me convidava para passeata do bem, e uma turma de jovens vestidos de palhaços cruzou a praça numa dança alegre que os conduziu para bem distante dali até sumir na multidão.

Vez ou outra um mictório a céu aberto nos trazia o odor forte de uréia acumulada da noite passada.

Por um momento tive a sensação de que eu era apenas um ínfimo personagem daquela grande peça de teatro de vários "atos", aonde por ora se encenava um complexo e incompreensível ato chamado "as festas duma humanidade sem rumo".

Lá dentro dei folga às minhas lentes fotográficas, me ajoelhei próximo ao presépio ainda montado e rezei fervorosamente pela cidade, pelos cidadãos, pelos políticos, pela paz, enfim, pedindo a Deus por consciência para todos num momento tão difícil da nossa cidade, inclusa num não menos difícil Brasil.

Começava a Homilia do dia e nosso Arcebispo nos pedia frente à toda classe elesiástica e aos mesmos endereçados da minha anônima oração, para que medidas urgentes fossem tomadas por todos nós, "grandes" e "pequenos" Homens, que desde os mais ínfimos atos do nosso dia-a dia de cidadão até à complexidade executiva das mais (perdidas-este adjetivo foi por minha conta) e difíceis gestões públicas , para que não nos omitíssemos das ações de cada um em prol da verdadeira justiça social.

Naquele momento percebi que os púlpitos da Catedral se iluminaram com os flashes de toda a imprensa e as tantas falas e promessas ali seladas, ainda que em pensamento, de lá partiriam "on line" para ao mundo, já que garantidos estavam também todos os furos de reportagens e as esperadas manchetes da "grande festa" para as páginas das mídias do dia seguinte.

Lá fora, os visitantes alegremente dobravam o "sino pela paz" aquele que localizado ao lado do museu Anchieta nos convida simbolicamente a lembrarmos que , ao menos ali, a PAZ é praticada na nossa cidade, inclusive pelos cidadãos do mundo.

Andei mais alguns passos e um pouco mais adiante...o impostômero sequer nos dava trégua aos olhos frente aos números que não paravam de subir...

Saí dali com minha fotos como se fossem relíquias duma humanidade perdida e com uma incômoda sensação de que exatamente" ali, no "MARCO-ZERO" da nossa história aonde o tudo aquilo que vi começou, o nosso todo social, infelizmente, está muito longe de terminar.