Medalhas são medalhas
Embalei minha medalha fabulosa com papéis de seda e a coloquei na cristaleira.
Meu bebê se foi antes de nascer e não ficaram os abraços sonhados. Faz uns dias estou me sentindo como aquela mãe que o filho foi pra guerra, e ao invés de retornar pro seio familiar, mandaram-lhe uma medalha. Sim, uma medalha!... Vejo-me como a mãe que recebeu a insígnia ao invés do amor do filho. Quisera eu voltar no tempo e retornar pro sítio, lá no meio das gentes humildes e jamais ter atravessado as turbulências do oceano, e ser feliz de nunca saber das pompas dos palácios de além-mar.
Brindamos com as medalhas, então... no melhor estilo francês, dançamos a valsa dos vencedores. Mas, quem são os vencedores? Os que tiveram mentes privilegiadas ou aquela mãe que teve seus dez filhos lá no interior, trabalhando de sol a sol, erguendo-se de madrugada pra tratar a vaquinha que dava leite pros seus filhos, como minha mãe?!
Erguemos nossas mãos e cantamos, e nossos punhos cortaram o ar com ímpeto e galhardia: wow...wow... wow... vencemos!!!... teers!!!... un brindisi!... (esqueci como se brinda em francês).
Depois da festa, depois de exauridos os aplausos de vencedora, tomei a medalha nas mãos... e lembrei-me do sangue escorrido, senti o calor das mãos trêmulas.
O coração e a medalha. Medalha e coração.
O coração e a medalha e a pele fria... embrutecida.
O sonho se foi... O Universo não vai me dar a família que eu merecia. Não me trará de volta os abraços calorosos do filho amado. O filho se foi... a família se dissolveu.
Matéria bruta, peça de metal... medalhas são medalhas!
É brasa acesa... é duro embate.
Uma inscrição... um emblema!
Eu que sou tão livre, só queria laços, os enlaços calorosos de algum ser que eternamente coubesse no meu colo. Estreitar contra o peito o menino lindo fruto do amor mais puro.
E aconteceu de um homem simples me encontrar. E, olhando a beleza da medalha, turvou-se-lhe a vista, supos isso e aquilo e aquilo lá... e com olhos de admiração, no ofuscamento do metal, e com medo de amassar minha medalha, afastou-se... e eu fiquei sem os abraços, sem os beijos calorosos de um ser humano quem sabe muito especial.
E, novamente, ontem... o meu olhar vitrificado seguiu o horizonte... mais uma vez. Demorou-se ali no canto do olho uma gota d’água... Com passos lentos, delicadamente, fui regar as rosas e as camélias vermelhas do meu jardim.
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IZABELLA PAVESI
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imagem: arquivo pessoal
Embalei minha medalha fabulosa com papéis de seda e a coloquei na cristaleira.
Meu bebê se foi antes de nascer e não ficaram os abraços sonhados. Faz uns dias estou me sentindo como aquela mãe que o filho foi pra guerra, e ao invés de retornar pro seio familiar, mandaram-lhe uma medalha. Sim, uma medalha!... Vejo-me como a mãe que recebeu a insígnia ao invés do amor do filho. Quisera eu voltar no tempo e retornar pro sítio, lá no meio das gentes humildes e jamais ter atravessado as turbulências do oceano, e ser feliz de nunca saber das pompas dos palácios de além-mar.
Brindamos com as medalhas, então... no melhor estilo francês, dançamos a valsa dos vencedores. Mas, quem são os vencedores? Os que tiveram mentes privilegiadas ou aquela mãe que teve seus dez filhos lá no interior, trabalhando de sol a sol, erguendo-se de madrugada pra tratar a vaquinha que dava leite pros seus filhos, como minha mãe?!
Erguemos nossas mãos e cantamos, e nossos punhos cortaram o ar com ímpeto e galhardia: wow...wow... wow... vencemos!!!... teers!!!... un brindisi!... (esqueci como se brinda em francês).
Depois da festa, depois de exauridos os aplausos de vencedora, tomei a medalha nas mãos... e lembrei-me do sangue escorrido, senti o calor das mãos trêmulas.
O coração e a medalha. Medalha e coração.
O coração e a medalha e a pele fria... embrutecida.
O sonho se foi... O Universo não vai me dar a família que eu merecia. Não me trará de volta os abraços calorosos do filho amado. O filho se foi... a família se dissolveu.
Matéria bruta, peça de metal... medalhas são medalhas!
É brasa acesa... é duro embate.
Uma inscrição... um emblema!
Eu que sou tão livre, só queria laços, os enlaços calorosos de algum ser que eternamente coubesse no meu colo. Estreitar contra o peito o menino lindo fruto do amor mais puro.
E aconteceu de um homem simples me encontrar. E, olhando a beleza da medalha, turvou-se-lhe a vista, supos isso e aquilo e aquilo lá... e com olhos de admiração, no ofuscamento do metal, e com medo de amassar minha medalha, afastou-se... e eu fiquei sem os abraços, sem os beijos calorosos de um ser humano quem sabe muito especial.
E, novamente, ontem... o meu olhar vitrificado seguiu o horizonte... mais uma vez. Demorou-se ali no canto do olho uma gota d’água... Com passos lentos, delicadamente, fui regar as rosas e as camélias vermelhas do meu jardim.
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IZABELLA PAVESI
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imagem: arquivo pessoal