PRA DIZER QUE NÃO FALEI DAS FLORAS

Existem coisas que todo mundo faz, mas parece que é meio impróprio falar sobre o assunto. São eventos naturais com abundantes verbetes no vernáculo, mas que parece ser meio proibido usar para descrevê-los. Por exemplo, (é só uma hipótese, não se estremeça) se eu escrevesse aqui as palavras cagar, bosta, merda (ainda não as escrevi, estou só conjecturando) algumas pessoas achariam que são palavras chulas, que o texto estaria com o conteúdo comprometido, que esta crônica é uma matéria fecal ou até mesmo desistiria de continuar lendo. Ora, mas todas as pessoas defecam, todos os seres humanos normais descomem, então ninguém deveria se melindrar com isso. Aliás, absurdo é não excrementar, pode ser sinal de grave doença. Se alguém deseja nunca expelir suas fezes advirto: isso vai dar bolo fecal.

Mas vamos falar sério mesmo, uma das boas coisas da vida é dar uma evacuada maneira num banheiro limpo. Pense num negócio bom! Imagina que você está num engarrafamento há horas e desde o inicio seu intestino emitira vários avisos sonoros a respeito de suas necessidades fisiológicas. O tempo vai passando e os sinais agora são terríveis contrações. Ai você chega a casa, entra no seu banheirinho gostoso e arria um barro pra mais de quilo. Bom demais da conta, sô! Você se levanta do trono pensando que é o Rei da Espanha. E tem aquele negócio de se despedir da caca. Uma mão no botão da descarga e a outra dando tchauzinho pros cocôs. Que bonitinho!

Além do mais, é um momento onde todos somos iguais, ricos e pobres, pretos e brancos, homens e mulheres, jovens e crianças. Certo dia vi na porta de um banheiro o seguinte verso: É nesse lugar solitário/Que todo orgulho se acaba/Todo preguiçoso faz força/E todo valente se caga. De Vinicius de Morais inspirado em Fernando Pessoa.

Estranho que ninguém fala sobre isso. E quando fazem alguma referência fica como algo nojento, podre, ruim. Que é isso, gente? Cagar, ou desculpe, defecar é maravilhoso, normal, santo e bom. Há pessoas que têm um verdadeiro ritual para o momento sagrado da evacuação diária. Sempre no mesmo horário, sempre no mesmo banheiro, a mesma maneira de abrir e fechar a porta, de tirar as vestes, de usar o papel (conferindo antes de jogar na lixeira), de usar a ducha fria e se arrepiar – deve ser água benta. Quantos elementos de uma ortodoxa liturgia. No silencio da sua clausura toaletal, compenetradíssimo, se delicia no ato biblicamente chamado de “aliviar o ventre”. Sagrado.

Para encerrar, entenda que existem vários tipos de defecação. Você pode expelir dejetos intestinais de várias formas, mas há uma classificação na maneira de “passar um telegrama”. Vou tentar listar:

Download – arriação de barro enquanto acessa a internet pelo celular.

Rainha da Inglaterra – quando se senta no trono e não quer mais sair.

Remunerada – é aquela evacuada no meio do expediente e no banheiro da empresa.

Intelectual – ato de ler um livro enquanto se borra.

Enigmática – ato de fazer palavras cruzadas enquanto se expulsa excremento pelo ânus.

Talentosa – quando se defeca cantarolando. Poucos conseguem, é muito talento. A cada agudo cai uma caca.

Boa pontaria – quando não se senta no sanitário sujo e procura acertar direto no buraquinho da privada.

Lava jato – quando a matéria fecal sólida cai com força e espirra aquela água imunda pro bumbum.

Fusão – quando tudo que devia ser sólido passou para o estado líquido.

Bucólica – fazer cocô atrás de moitas em bosques, florestas, pomares, jardins, etc.

Surfista – obrar na praia. O cocôzinho fica fazendo manobras radicais.

Parto – saída de toletes gigantes, que você não sabe se está cagando ou se está parindo.