Internação compulsória
Agora é Lei. Mesmo se eu não desejar ser tratado, mesmo se eu quiser morrer lascado com meus vícios, o governo vai poder me conduzir a uma desgraça tão grande ou maior que esta que já me consome.
Levanto os olhos em direção ao que poderia ser minha redenção, aos olhos da sociedade que decide o que é bom e o que é ruim para mim e para todos. E o que vejo?
Minha mãe me trouxe compulsoriamente ao mundo, onde fui compulsoriamente obrigado a me fazer parte de uma sociedade que não me permite nem mesmo optar por deixá-la.
Sou obrigado a estudar, obrigado a conhecer as leis do país, obrigado a trabalhar e a pagar impostos injustos. Obrigam-me a não reclamar e a não reagir, nem contra o governo, nem contra os ladrões sem cargo público.
Me obrigam a ter uma religião, a viver uma sexualidade escravizante e um amor alienante. Ou sou como todos ou sou louco. E louco a gente põe de lado, despreza, interna, até compulsoriamente.
Me internaram sem meu aval no mundo, de onde eu não consigo sair vivo e também não consigo viver dentro. Então, busco uma fuga fácil e barata, sem muito custo imediato, com um retorno incrivelmente prazeroso e aí vocês me aparecem com essa coisa de internação compulsória...
Que querem agora? Que eu saia do mundo que criei pra fugir desse no qual tentaram me aprisionar a vida toda? E querem que eu vá de boa vontade?
Pois bem, eu desisto. Eu me entrego, mas com uma condição... Me mostrem o mundo bom, perfeito, agradável, sem perigo para a minha vida e para a minha saúde. Me apresentem o lugar limpo, seguro, organizado, apropriado à vida humana, onde eu não terei motivos, nem vontade de me entorpecer, de fugir.
Me mostrem o que me fará aceitar seu mundo e ir pra ele sem a necessidade de internação compulsória.