MEU RIO NÃO É CARTÃO POSTAL

Por: josafá bonfim

É sempre bom voltar ao rio da minha terra natal. Digo: à beira rio. Sentar na calçada alta do velho pouso. Parada obrigatória no passado, palco de tantas e tantas horas de prosa com amáveis conterrâneos a beliscar um apetitoso surubim, quase sempre regado a goles da bebida preferida. Ali quando me encontro, encontro-me comigo mesmo, e consigo desconectar-me dos ruídos do urbanismo.

Por esses dias estive lá mais uma vez. Pude avistar-me com as águas de minha dileta fonte, que em vez de cristalina, são barrentas. De margens cadentes, descuidadas e esquecidas pelo poder público. Bem diferente do que cantam os cancioneiros, versejam os poetas e embelezam postais de metrópole. Mas não faz mal, importante é que apesar de tudo este é o meu dileto e predileto rio.

O leito corre brandamente enquanto o velho pescador, da sua desgastada canoa, retira seu sustento do espinhel, traduzido em minúsculos mandis (bagres), que ainda povoam a corrente.

O Martim-pescador plaina sobre o “espelho corrente” no afã de colher a refeição, de um só e fatal mergulho.

No observatório do meu rio não se vislumbra o lindo por do sol, pois a vegetação que resiste a ação humana, insiste em reagir, não permitindo. Nem paisagens paradisíacas são constatadas, como contam as fábulas e versos, mas é belo mesmo assim. Afinal, é o meu rio.

Lá, da água não se bebe, mas ainda se banha. Ainda se refresca o corpo das murrinhas que o tranco da labuta diária deixa.

O velho pontilhão de madeira e a canoa da passagem foram em nome da evolução substituídos por uma nova e estruturante ponte pré-moldada em concreto. É o progresso que aos poucos mostra a cara. Um visual moderno, inovador, mas não tão terno e aconchegante quanto o de outrora, que ainda habita na nossa imaginação.

Bom, fiquem com a evolução estruturante do progresso, enquanto vou ficando um pouco mais por aqui, a mergulhar em belas e límpidas lembranças. Daqueles momentos que se foram e jamais esquecerão de virem sempre, cada vez que num pequeno exercício de memória, ou mesmo falta do que fazer, recorremos à nossa realidade, que se eternizara entre barrancas, de quem os anos não foram capazes de nos separar, apesar dos tempos e contratempos que temos enfrentado: eu e o velho rio.

São Luís/MA, 17 de janeiro de 2013

josafá bonfim
Enviado por josafá bonfim em 17/01/2013
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