O EMPRESÁRIO
UM EMPRESÁRIO
A mentira tem pernas curtas, diz o dito popular. Para ser mentiroso, o sujeito tem que ter muita verve, muita criatividade para sair de situações embaraços. Não pode fazer como um amigo meu de infância, que mentia muito e quando passava dos limites nós, para nos livrarmos do mentiroso, pedíamos que ele contasse a história que ele morria no fim. Envergonhado e cabisbaixo se retirava, para no outro dia estar de volta a contar outras histórias.
Mas, este não era o caso do Polonês, um colega de trabalho que tinha muita verve e uma criatividade fora de série.
Trabalhamos durante alguns anos juntos. Ele no escritório do Sul e eu no Rio de Janeiro. Vez por outra, por necessidade de pessoal, o Polonês era escalado para nos ajudar lá no Rio de Janeiro.
Travamos boa amizade. Sempre saíamos para tomar uns chopes no Centro do Rio de Janeiro ou em Copacabana, onde costumava se hospedar quando na Cidade Maravilhosa, tanto pela facilidade de locomoção, como pelo que representava Copacabana naquele tempo: o lugar mais badalado do Rio de Janeiro. Não havia ainda a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes, lugares longíquos e praias desertas.
Como éramos dois apaixonados por futebol, vez por outra também íamos jogar bola juntos. Na época eu jogava pela seleção da faculdade e três vezes por semana tinha treinos na quadra do São Cristóvão, na Rua Figueira de Melo e vez por outra, quando o Polonês estava no Rio eu o levava para treinar conosco.
O Rio era relativamente tranquilo. Quando saímos do treino, por volta da 22 horas, ainda dava para tomar um chope, sem a preocupação com a violência e o estresse de hoje.
Daí, criamos uma grande amizade, que durou alguns anos, enquanto nos vimos. Depois sai da empresa e voltei para o Ceará e ele continuou no Sul por algum tempo, tendo ido morar em Londres uma época, pelo que soube.
Quando cheguei ao Ceará, fui trabalhar no mesmo ramo que atuava no Rio de Janeiro, em auditoria independente. Já o Polonês, teve uma boa proposta, e saiu para uma empresa em Porta Alegre, como auditor interna.
No ramo de auditoria, viajávamos muito. Pois os contratos de trabalha abrangiam empresas em toda parte do país. Além disso, havia muita carência de pessoal especializado, e algumas áreas tinham de ser cobertas por profissionais de outros escritórios. Desta forma, vivíamos constantemente de malas prontas.
É tanto, que devido a minha profissão hoje conheço o Brasil quase todo. Faltando apenas três estados do Norte: Amapá, Roraima e Acre; um do Nordeste: Alagoas e dois do Centro-Oeste: Tocantins e Mato Grosso do Sul. Embora em algumas localidades de Tocantins já tenha estado.
Viajávamos tanto, e para tantas localidades, que conheço o País de Norte a Sul, de Leste a Oeste e não somente capitais, mais os interiores mais remotos, lugares onde para uma pessoa chegar, como Xinguara a 200 quilômetros de Conceição do Araguaia, onde havia aeroporto, tinha-se que viajar de 9 a 10 horas em automóvel novo, para percorrer este pequeno percurso, pois a estradas erra horríveis. O carro tinha que ser novo. Naquelas estradas esburacadas, carro velho quebrava no meio do caminho e aí poderia se ficar dias no meio do nada, da Selva Amazônica a mercê de um transeunte qualquer de nos ajudasse.
Mas deixemos essa história de lado e voltemos ao Polonês. Pois bem. Devido à amizade que fizemos, certo dia ele me disse que o pai dele havia lhe dado um apartamento de presente em Porto Alegre. Por curiosidade, perguntei o que o pai dele fazia.
- Tem uma grande transportadora em São Paulo, respondeu-me. Nós moramos em Porto Alegre porque ele e a mamãe são separados.
O tempo passou. Fui para o Ceará, como disse anteriormente, e comecei a trabalhar numa empresa de auditoria independente, até que o destino nos juntou novamente.
Ao Rio Grande do Sul me mandara para treinamento e também trabalhar em algumas empresas, como parte do treinamento de campo. Num desses trabalhos fui para o interior do Estado, onde encontrei o Polonês, que agora era chefe do setor de custos da empresa que eu estava auditando.
Ao nos encontrarmos, falamos logo em futebol. E ele me convidou para participar de uma pelada em Viamão, cidade que faz parte da grande Porto Alegre. Combinamos o dia, ele foi me apanhar no hotel. E lá fomos nós, numa noite fria do Sul jogar futebol. Antes de irmos para a quadra, passamos na casa de Polonês e lá encontro seu pai trabalhando numa pequena venda.
Anos antes, quando nos conhecêramos, Polonês havia me dito, como já mencionei, que seu pai era empresário em São Paulo, dono de uma grande transportadora. Naquele dia, vendo o pai dele atrás da grande da janela de uma pequena venda, nos me contive e sem segundas intenções, mas num momento que não raciocinamos, num repente, perguntei-lhe:
- Polonês, tu não me disseste que teu pai morava em São Paulo e que tinha uma grande transportadora lá?
- Sem perder a empáfia que lhe era peculiar, mas que não o tornava arrogante, respondeu: “ meu pai é muito burro. Vendeu a transportadora, pagou todos os credores e ficou apenas com essa bodega.”
E fomos jogar futebol.
Fortaleza, janeiro de 2013.