A prisão
O relógio tiquetaqueava incessantes segundos amontoados de livros que muito tinham a dizer, mas que não falavam nada. As paredes em paralelo comprimiam duas camas de solteiro com roupas, redes, maletas e outros objetos espalhados encima delas. Guarda-roupas estáticos a observarem o marasmo daquela cena. Um livro de Roterdã a elogiar a loucura parecia conveniente àquela situação, mas a mente estava cheia e não o empregava atenção. Quadros, empilhados em um móvel, não achavam pregos que os assentassem. A arte se perdia naquele ambiente conturbado. Ouviam-se vozes além da porta trancafiada. Eram duas mulheres a praguejar futilidade e mesquinhez.
Estar preso por opção parece a melhor alternativa para fugir daquele cotidiano e daquelas mentes tão pequenas. O contato e a comunicação nesse momento pouco interessavam, já que ninguém teria nada a acrescentar. Nada é tão difícil de entender quando se esboça o mínimo esforço para a compreensão. A não adequação a uma casa repleta de pessoas dos mais altos níveis de ignorância e mediocridade é o que faz a prisão parecer algo desejável.
Mas aquelas vozes estridentes ainda incomodavam, não queria ouvi-las. O silêncio é o que mais almejava nesse instante. Mas o relógio também alardeava a falta de paz. Ao longe, ouvia-se o som de uma televisão vomitando informações inúteis, a trazer mais irritação. Nada esse antro tem a oferecer. Apenas a solidão poderia trazer calma nesse momento. Mas apesar de estar só neste quarto, os sons alheios eram enlouquecedores. Talvez apenas um sono serrado o afastasse dessa realidade. Estaria, enfim, imerso na escuridão e teria o silêncio que merecia e que tanto pedia à solidão.