A TRISTE ARTE DE FUMAR EM PARIS

Fumar é uma das atividades mais intensas e, infelizmente, constantes na capital parisiense, hábito tão arraigado e com tal profundidade que todos começam nesse caminho triste ainda jovens, desafiando o poder da morte na flor da juventude. Praticamente todos os habitantes de Paris fumam, é fácil ver nas ruas e calçadas as multidões, pessoas de todas as idades, pitando sua fumacinha perigosa, tragando sofregamente, soltando as baforadas nos rostos uns dos outros, ou nos passantes, fumantes ou não, conversando nas esquinas e trocando fumaçadas, fazendo aquele gesto que se tornou clássico e negligente de acender o cigarrito com o isqueiro, aspirar maravilhado(a) o rolo de fumaça sugado pelos lábios, depois, indiferente, saciado em seu vício maldito, soprar devagarinho a fuligem que, ao entrar em seu pulmão, já fez o estrago e deixou sua marca.

Para quem não fuma e compreende o cigarro como uma praga mortal capaz de provocar os mais diversos tipos de câncer tanto na laringe, na faringe, no estômago, na boca, na garganta, nos lábios, no pulmão, no intestino, quanto em qualquer parte do organismo humano, trata-se de verdadeiro suplício caminhar entre os que fumam, isto é, provavelmente todos os moradores de Paris. Desviar-se da fumaceira é verdadeira odisséia para essas pobres vítimas indiretas da nicotina dos fumantes, pois os que vão à frente, por vezes dez quinze pessoas, espalham o rastro do cigarro aceso por onde passam, e os que caminham atrás, também, indiferentes, tranquilos em seus gestos, inconscientes talvez do intenso mal transmitido aos transeuntes abstêmios do fumo.

Há restos de cigarros fumados jogados displicentemente no chão de Paris, em todos os lugares por onde os parisienses passam, nas esquinas, ao lado das paredes onde os fumantes se encostam para seu deleite mortal, nos cinzeiros dos lugares destinados a eles, alguns desses fragmentos ainda acesos e fazendo subir, lenta e perigosamente, para o ar respirado por todos a maldição de seu odor e da sua desgraça. Sujam e emporcalham a Cidade-Luz com essas piúbas horrendas, fedorentas, difundindo a fedentina do fumo queimado, permanecendo a cena interminável de forma cotidiana, porque eles continuam fumando todos os dias e vão atirando as sobras aonde vão, criando um infeliz círculo vicioso.

Evidentemente, torna-se muito difícil, quase impossível, suportar as centenas de cigarros acesos dia e noite pelos habitantes de Paris, especialmente para quem é alérgico à nicotina e precisa fugir desesperado do fumacê implacável poluindo todos os espaços, assim, caminhar por entre eles se transforma numa via crucis, faz-se necessário tampar o nariz com o cachecol, mudar de calçada, procurar caminhos alternativos onde o movimento humano seja menor, o mínimo possível e tentar chegar ao seu destino sem o infortúnio de respirar o ar contaminado pelas inúmeras e contínuas baforadas. No entanto, se tiver uma só pessoa na rua, bastará somente uma, ela com certeza estará fumando.

Sentirei saudade das deliciosas baguetes de Paris quando voltar para o Brasil, do brilho e beleza da Torre Eiffel, seu símbolo maior e mais vistoso, dos passeios a pé nos bairros e no centro, das milhares de lojas que fazem do seu comércio um dos mais ricos e grandiosos da Europa, do romantismo fascinante que reina na capital da França, de sua gastronomia desfrutada por mim ao longo de um mês, sim, sentirei saudades demasiadas da Paris tão amada e sonhada pelo mundo, pois essa linda e esplendorosa capital tem uma aura de fascínio e sedução, mas sentirei também, ao mesmo tempo, alívio por não ter que aspirar a triste, constante e mortal fumaça dos incontáveis cigarros parisienses acesos por mãos trêmulas e desejados lábios ansiosos.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 11/01/2013
Reeditado em 11/01/2013
Código do texto: T4079885
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