Menino precoce
Diz que era um menino de uma precocidade extraordinária e vai daí a gente percebe logo que o menino era um chato, pois não existe nada mais chato que menino precoce e velho assanhado.
Todos devemos viver as épocas condizentes com as nossas idades; do contrário, enchemos o próximo.
Mas deixemos de filosofias sutis e narremos: diz que o menino era tão precoce que nasceu falando. Quando o pai soube disso não acreditou. O pai não tinha ido à maternidade, no dia em que o filho nasceu, não só porque não precisava, como também porque tinha que apanhar uma erva com o Zé Luís de Magalhães Lins, para pagar a "délivrance" que era quase o preço de um duplex, pois a mulher cismou de ir para a casa de saúde do Guilherme Romano.
Mas isto também não vem ao caso. O que importa é que o menino já nasceu falando.
Quando o pai soube da novidade, correu à maternidade para ouvir o que tinha o menino a dizer. Chegou perto da incubadeira e o garoto logo se identificou com um "Oba". O cara ficou assombrado e mais assombrado ficou quando o nenenzinho disse:
— Papai vai morrer às 2 horas! — dito o que, passou a chupar o bico da mamadeira e mais não disse nem lhe foi perguntado.
O cara voltou para casa inteiramente abilolado. Sem conter o nervosismo, não contou pra ninguém a previsão do menininho precoce, mas ficou remoendo aquilo. Dez e meia, onze, meio-dia... e o cara começou a suar frio.
Uma da tarde, o cara já estava suando mais que o marcador de Pelé.
Quando deu duas horas ele estava praticamente arrasado e quando passou da hora prevista um minuto ele começou a se sentir mais aliviado.
E estava dando o seu primeiro suspiro, quando ouviu um barulho na casa do vizinho. Uma gritaria, uma choradeira. Correu para ver o que era: o dono da casa tinha acabado de falecer.
Nota: Neste dia 11 de janeiro estaria fazendo 90 anos, se tivesse vivo, o notável cronista carioca Sergio Porto, mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta. Aquele que escreveu o seu maior sucesso, "O festival de besteiras que assola o País- FEBEAPÁ". Morreu prematuramente com 46 anos. A homenagem ao cronista se justifica diante, a meu ver, de tanta mediocridade em todos os níveis de nossa sociedade, com as honrosas exceções, claro. As saudades são muitas dos grandes cronistas, da música com poesia, dos grandes comentaristas de futebol, como por exemplo, só pra lembrar: Armando Nogueira, João Saldanha, Nelson Rodrigues, José Maria Scassa, Ruy Porto e tantos outros. Esses, falando de futebol, faziam poesia, sociologia, psicologia e nos deleitavam com seus ensinamentos. Na música sentimos saudades do poetinha Vinicius, Tom Jobim e muitos outros. Há cinquenta anos havia uma espécie de iluminismo de inteligência. Então, nós mais velhos, aproveitando a data, matamos a saudade com esta deliciosa crônica, com o sabor e o humor bem carioca.