Prefeito, pipoca e procissão

Saí de casa, sob o mormaço da primeira tarde de 2013, para acompanhar a procissão de Bom Jesus dos Navegantes. As ruas do centro da cidade quietas, muitos curtindo o sono da ressaca da noite de Ano Novo. Entretanto, na Catedral, estavam as pessoas que foram abraçar o prefeito eleito que comemorava a vitória em uma missa. Mas sobre isto prefiro não falar.

A imagem de Bom Jesus dos Navegantes estava colocada no lugar estratégico, em um canto da Catedral Metropolitana de Aracaju. Pessoas chegavam para seguir o momento de fé em direção ao Rio Sergipe. A procissão saiu depois do horário previsto e veiculado em noticiário local, coisa comum e da cultura de nosso país e sobre o que não critico tanto. Cada povo do seu jeito.

Ao chegar à Ponte do Imperador, encontro um senhor vestido em uma camiseta com o símbolo do evento religioso estampado no peito. Frise-se que, para cada procissão, há a comercialização de camisetas alusivas ao santo, à santa, à data comemorativa. Sobre isto de vendas eu também não quero me alongar.

Esse senhor tinha na camiseta a estampa da cruz de Cristo. Então, abriu os braços diante de mim e disse que eu não poderia entrar no espaço da Ponte do Imperador, logradouro público e aberto desde quando foi construído para a chegada do Imperador D. Pedro II, no século XIX. Estranhei aquilo, fiquei atônita mesmo. De repente eis que um jovem casal de turistas foi impedido também. Uma senhora que andava com o auxílio de uma bengala, idem. E assim, a todos os que se aproximavam do bem público, aquela criatura mandava retornar.

Claro que eu não iria levar o desaforo para casa e comecei a questionar sobre os motivos e quais as autoridades que teriam dado aquela inusitada ordem. O homem me mostrava umas senhas e perguntava se eu tinha aquele pequeno “documento” distribuído na catedral. Não moço, eu não quero ir ao barco, eu tenho medo, quero apenas olhar de perto. Não pode e, se a senhora tem medo, é porque não tem fé, não acredita em Deus, bla bla bla. Piorou tudo, além de me impedir de andar em local público, me recriminava e duvidava da minha fé. O juízo fugiu totalmente e eu perguntei então no que cria a Igreja Católica que impedia o povo de ir e vir naquilo que lhe pertence.

Moço, quero saber de onde partiu tal determinação, pois se aqui estivesse uma representatividade da Polícia, do Exército, do Ministério Público, da Defesa Civil, eu aceitaria mediante a justificativa que tais órgãos, por acaso, apresentassem. Agora, daí a ver a Igreja Católica postar-se à frente de um monumento público e proibir a entrada de cidadãos, isto eu não aceito.

Indignada e insatisfeita, abandonei a procissão e fui à Sacristia da Catedral Metropolitana de Aracaju onde encontrei mais dois vestidos no mesmo tipo de camiseta, um rapaz e uma moça que, diligentemente, organizavam as toalhas do altar e as roupas dos padres. Demonstrei a minha repulsa, registrei a minha queixa e eles, sabe o meu leitor o que me disseram? NADA. Mantiveram aquele revoltante e frio ar de fingimento. Que lástima tudo isto, e logo após toda a conversa fiada de Feliz Ano Novo.